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quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Para morrermos, basta que estejamos vivos!

Fonte: correiobraziliense.com.br


Por Valter Machado da Fonseca

Ontem [25/01/2012], enquanto a TV anunciava o desabamento dos edifícios no centro do Rio de Janeiro [nas proximidades do Teatro Municipal], me dei conta de quanto a vida humana é irrisória. Passou-me pela mente um verdadeiro filme. Recordei do grande incêndio do edifício Joelma (SP) em 1974, da queda das torres gêmeas em 2001 e de diversos outros eventos e catástrofes fatais ocorridos pelo mundo afora.

A lembrança dessas catástrofes me trouxe importantes reflexões acerca da insignificância da vida humana. Aí, fiquei me perguntando quantas pessoas estariam, naquele exato instante, em um quarto de hospital em estado terminal. Outros, naquele mesmo instante, não estariam lutando com todas suas forças contra a morte, talvez vitimados por alguma moléstia fatal? Quantos, naquele exato instante, não estariam sendo vitimados por algum acidente também fatal em algum ponto de alguma estrada do Brasil e/ou do mundo? Muitas vezes deixamos fluir nossa arrogância diante de outrem, como se fôssemos eternos, como se não estivéssemos, a todo instante, à beira dos caminhos, trilhas e precipícios, que fatalmente levariam à morte. Quantas vezes não escapamos de uma fatalidade por um triz, sem nos darmos conta de quão próximos estivemos do fim da linha? Estas catástrofes servem também para que façamos reflexões sobre a vida, o mundo e o lugar que ocupamos nele.

Nós, enquanto seres humanos, somos providos de sentimentos e emoções. Somos providos da capacidade de sonhar, da capacidade de traçarmos projetos de vida e de consumo. Quantas vezes não traçamos nossos sonhos sem colocar neles outros seres humanos? Quantas vezes não transferimos para os nossos próprios sonhos o nosso egoísmo, excluindo deles pessoas que nos são caras, que compartilham conosco de toda uma vida? Como seres humanos somos providos de uma coisa chamada “consciência”. E esta consciência não se forma de maneira individual, mas, pelo contrário, se forma em interação com outros seres humanos em um processo coletivo, por meio de nossas ações no mundo, mediadas por relações sociais. É impossível, para um ser humano “normal” construir sua vida, seus sonhos, seus projetos de mundo e de vida na mediocridade da individualidade. O homem é um ser social por excelência! Mas, muitas vezes nos esquecemos deste detalhe. Em grande parte das vezes, só nos lembramos disso em momentos de desgraça, de catástrofes, de desespero.

Essas catástrofes e fatalidades do cotidiano servem, perfeitamente, para nos lembrarmos que a vida deve ser degustada a cada minuto como se ele fosse o último. Deve ser apreciada como se fosse um vinho de safra especial, deve ser saboreada sentindo todas as emoções em cada gole. É importante dizermos às pessoas que amamos [e às que odiamos] tudo que temos para dizer, pois, estamos sujeitos a, repentinamente, não possuirmos mais a oportunidade para tal, pois [como dizem os mais velhos], a vida não passa de um sopro.

Voltando às catástrofes repentinas devemos refletir: quantas pessoas soterradas não tinham diversos projetos de vida? Quantos não nutriam dentro de si, sonhos maravilhosos que poderiam ter sido colocados em prática? Mas, talvez por alguma razão banal, não tenham sido deixados de lado? Meus (minhas) caros (as) leitores (as)! Na vida, grande parte das oportunidades não se repete! Por isso, devemos [sempre] aproveitá-las da melhor forma possível. É tão simples dar um telefonema. É tão simples dar um sorriso para um amigo, para um parente, para um vizinho ou até mesmo para uma pessoa que não conhecemos. É tão simples perdoar! Pense sobre isto, pois, de repente você pode não ter nunca mais a oportunidade para isso. Talvez venhamos a sucumbir sem jamais ter saboreado o doce perfume do perdão.  Devemos ter a percepção que mesmo que não sejamos sepultados por uma fatalidade, podemos ser sepultados em nossa própria mediocridade, em nosso próprio egoísmo. A única condição necessária para que morramos é que estejamos vivos! Lembre-se sempre disso!

sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

As grandes catástrofes "naturais" e a solidariedade (?) humana

Prof. Valter Machado da Fonseca (2012)
Valter Machado da Fonseca
 
Outro dia, a TV mostrou a vida e o cotidiano dos haitianos que atravessam a fronteira na região de Rondônia (RO) para se refugiar no Brasil. Ela deu destaque à precariedade das condições de moradia, alimentação, saúde e higiene pelas quais passam estes refugiados na cidade de Porto Velho, capital de Rondônia. Ficam amontoados em abrigos e albergues precários, em locais sem nenhum saneamento básico e com alimentação altamente deficitária. A mídia me chamou a atenção sobre o descaso, o sensacionalismo, e a falta de seriedade com que são tratadas as vítimas das grandes catástrofes “naturais”, não somente em nosso país, mas em todas as partes do mundo.
 
Os haitianos que se amontoam clandestinamente em Rondônia são os mesmos que em 2010 foram vitimados pelas consequências do grande evento sísmico (terremoto) que assolou o Haiti naquele ano. Todos devem se lembrar que aquela catástrofe deixou atônita e mobilizou toda a opinião pública mundial. Campanhas fabulosas de solidariedade foram desencadeadas em diversas regiões do planeta em prol da população do Haiti. Hoje, menos de dois anos após a tragédia, a população daquele país já caiu no esquecimento. As tais campanhas de solidariedade, ao invés de alavancar ações que visassem pelo menos a minimizar a situação de intensa miséria daquele povo, só serviu para criar o sensacionalismo midiático visando puramente à venda de notícias, enriquecendo alguns poucos em detrimento de toda a população extremamente carente de um país.
 
No Brasil, a situação é a mesma quando se tratam das vítimas das grandes catástrofes climáticas que assolam diversas áreas de nosso imenso território. Foi assim com a catástrofe recente de Santa Catarina, com a tragédia climática da região serrana do Rio de janeiro em 2011 e vai ser assim com as vitimas da histórica inundação que hoje deixa debaixo d’água inúmeras cidades dos estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro e Espírito Santo.
 
Há pouco tempo a mídia mostrou a situação de penúria dos vitimados de Santa Catarina, um ano após a tragédia. Poucos dias atrás a mesma imprensa destacou, inclusive mostrando fortes imagens, a situação dos sobreviventes do desastre climático da região serrana do Rio de Janeiro, que ainda não terminaram de contar seus mortos. O mais interessante é que todas essas tragédias foram marcadas por gigantescas campanhas de solidariedade, com arrecadação de agasalhos, alimentos e remédios [principalmente por parte da população] em resposta ao imenso sensacionalismo dado pelas fontes midiáticas, para, logo em seguida, cair no esquecimento. Não estou dizendo que as campanhas não devam ser feitas, mas, o que quero enfatizar é que as vítimas não necessitam de auxílio somente na época em que ocorrem as catástrofes, mas, sobretudo, necessitam de amparo e apoio para reconstruírem suas vidas, o que demanda a continuidade das ações, mesmo após os momentos mais agudos.
 
Por outro lado assistimos, em todos esses episódios de inigualável tristeza, que marcam a história de nosso povo, a demagogia e o descaso com que nossos governantes tratam tais acontecimentos. Esse descaso ocorre tanto em nível nacional, quanto estadual e municipal. Verificamos o desvio de recursos financeiros, originalmente destinados ao amparo às vítimas, visando favorecer as benesses políticas de ministros, senadores, deputados, prefeitos e, por incrível que pareça, até de vereadores. Estes senhores se aproveitam, vergonhosamente, da desgraça dos setores mais carentes da população, para engordar seus já abarrotados bolsos e fortalecer seus currais eleitorais. Caros (as) Leitores (as)! É chegado o momento de nosso povo dar um basta nesta corrupção grotesca e vergonhosa que assola nosso país. Não dá mais para conviver com este tipo de situação, como se nada tivesse ocorrendo. O povo brasileiro precisa exigir a verdadeira ética de nossos dirigentes. Ética que a grande maioria dos politiqueiros de plantão repete nos palanques eleitorais sem saber sequer seu real significado. Pobres coitados dos haitianos que querem, a todo custo, fugir da miséria e sofrimento de seu país, refugiando-se no Brasil. Mal sabem eles que o verdadeiro Haiti é aqui!     

domingo, 8 de janeiro de 2012

MG, RJ e ES debaixo d’água: de quem é a culpa?

Fonte: matutando.com (2012)

Valter Machado da Fonseca*

Esta não é a primeira vez que trato desta temática. Escrevi sobre o tema quando ocorreu a série de enchentes e inundações em Uberaba, quando da catástrofe na região serrana no Estado do Rio de Janeiro e em diversas outras ocasiões. Portanto, não se trata de uma abordagem nova, mas que se faz profundamente necessária, uma vez que os organismos do poder publico brasileiro, nos três níveis (municipal, estadual e nacional) nunca se preocuparam com o planejamento urbano, agindo como “apagadores de incêndio” na época das ocorrências dos grandes eventos climáticos que atingem as principais cidades brasileiras. À época das grandes catástrofes, as instituições e autoridades agem pontualmente, gastando verdadeiras fortunas para sanar os males causados pelos estragos. Nunca são colocadas em pauta políticas e ações preventivas visando a minimizar ou mesmo evitar tais danos ao ambiente e às populações. Isto sem contar a parcela de políticos que sobrevivem da desgraça humana, desviando recursos originalmente destinados ao socorro às vítimas das enchentes e inundações em várias localidades do nosso país. É a chamada “Indústria das enchentes”.
O planejamento urbano é uma questão chave para o enfrentamento da problemática ligada às alterações climáticas que afetam os centros urbanos em todo o planeta. Com o advento do capitalismo, houve um deslocamento gigantesco de grandes contingentes humanos (migração) do campo (espaço agrário) em direção aos centros urbanos. Hoje, a ampla maioria da população mundial se concentra no espaço urbano (cidades). Desde o início deste deslocamento, a questão do planejamento urbano se tornou crucial e foi colocada na ordem do dia, visando ao enfrentamento dos danos e consequências provocados pala intensa concentração de gigantescas parcelas da população no espaço urbano. A ausência de planejamento aliada à grande desigualdade social (uma das principais mazelas do sistema capitalista) foi uma das principais causadoras da dicotomia centro-periferias pobres nas médias e grandes cidades brasileiras e o surgimento dos primeiros núcleos de favelas. Com o aumento e valorização das áreas planas urbanas, grandes contingentes das populações carentes são empurrados para os espaços não habitáveis, áreas insalubres e de risco do entorno das cidades. Iniciou-se assim o perverso processo de “segregação socioespacial”, aprofundando ainda mais o imenso abismo que separa a população rica das parcelas mais miseráveis de seres humanos que habitam os labirintos das favelas e das periferias pobres dos centros urbanos.
Os fatores elencados acima se agravam ainda mais quando combinados com ações extremamente incorretas e equivocadas ligadas à ocupação de diversas porções do ambiente urbano como as encostas de morros, os vales de rios, vertentes, topos de morros e montanhas. Nesta virada dos anos 2011/2012 assistimos atônitos às maiores enchentes e inundações que encobriram parcelas consideráveis dos estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro e Espírito Santo. Estes eventos, além de ceifar as vidas de dezenas de pessoas, deixaram milhares de desabrigados, trazendo doenças, além de danos materiais de toda sorte.
Se observarmos com mais atenção estas catástrofes climáticas, veremos que sua origem vincula-se à canalização de corpos d’água, ocupação de vales de rios, riachos e córregos que cortam as cidades, construções em vertentes e encostas de morros. Aí, convém levantarmos a indagação: quem são os principais responsáveis por estas catástrofes? Será que a culpa é da natureza? Não! Absolutamente não! A culpa é dos seres humanos e, em particular dos responsáveis pela implantação de políticas urbanas. Pela elaboração de planos diretores das cidades e pelo uso, gestão e manejo incorretos do solo urbano.
Na verdade, muito se fala em defesa do ambiente, em desenvolvimento sustentável (ou “insustentável”), em planejamento urbano/industrial. Mas, na verdade estes discursos não saem do papel, são artificiais, fictícios e fantasiosos. Geralmente vêm à tona nos momentos de ocorrência das grandes catástrofes ou em períodos que antecedem os processos eleitorais. Enquanto o planejamento urbano/industrial não for levado efetivamente a sério, milhares de pessoas continuarão sendo soterradas em suas próprias casas, enquanto algumas poucas dezenas continuarão se enriquecendo à custa da desgraça humana, especialmente dos setores mais carentes e marginalizados das populações dos centros urbanos brasileiros.   
 

* Escritor. Geógrafo, mestre e doutorando pela UFU. Pesquisador e docente da Universidade de Uberaba (Uniube). machado04fonseca@gmail.com