Foto: Prof. Dr. Valter Machado da Fonseca (2013) Fonte: Arquivo pessoal Prof. Valter Fonseca |
Prof.
Dr. Valter Machado da Fonseca
O
desenvolvimento da sociedade capitalista, com o surgimento das tecnologias do
campo, promoveu uma revirada espetacular nas formas e técnicas de produção
agrícola, nas relações do homem com a terra e nas relações sociais no campo
brasileiro. Por um lado, ela concentrou ainda mais as riquezas nas mãos dos
grandes grupos e conglomerados agroindustriais e, por outro lado, aprofundou
ainda mais os processos de desigualdade social e exclusão socioespacial no
campo brasileiro.
Para
justificar o parágrafo acima nos valemos do trabalho de (FERNANDES, 1999,
p.28):
O campo
brasileiro passou por profunda modernização, em alguns setores da agricultura,
onde o capitalismo fincou sua mais espetacular expansão nas últimas décadas.
Esse processo gerou uma extraordinária migração rural, por meio da expulsão de
30 milhões de pessoas, entre 1960 -1980, sendo que 16 milhões migraram somente
na década de 70. Esse processo de transformação da sociedade moderna durou pelo
menos 300 anos na Inglaterra e 200 anos nos EUA. O impacto social foi a extrema
concentração urbana, o desemprego e a violência. O impacto econômico foi a
implantação do parque industrial brasileiro.
Desta forma, o denominado processo de “modernização do
campo” trouxe drásticas consequências para os pequenos produtores, camponeses,
extrativistas e coletores que viviam da agricultura de subsistência e dos
frutos do campo. As décadas de 1960/1980 elencadas por Fernandes foram
exatamente aquelas em que o campo brasileiro serviu de gigantesco laboratório
para os experimentos dos pacotes tecnológicos advindos da denominada “Revolução
Verde”. Estes pacotes tecnológicos, além de provocarem um violento impacto
sociocultural no campo brasileiro, foram ainda responsáveis pelo despejo de
incontáveis toneladas de insumos, pesticidas e agrotóxicos nos solos e nas
águas do campo brasileiro. Imaginem um contingente de 30 milhões de
trabalhadores rurais sendo despejados nas periferias urbanas, num espaço de
tempo de apenas 30 anos. Fernandes (1999) continua sua argumentação sobre os
impactos no campo brasileiro:
As transformações
recentes da agricultura possibilitaram a criação da combinação agroindustrial e
do desenvolvimento do cooperativismo. Todavia, essa transformação privilegiou a
agricultura capitalista em detrimento da agricultura familiar, que foi
renegada, banida do modelo econômico adotado pelos governos militares, situação
que permanece até hoje. A modernização da agricultura capitalista,
contraditoriamente, aumentou a produtividade e o desemprego. Esse fato aumentou
o número de trabalhadores sem-terra, que engrossaram os movimentos sociais na luta
pela terra e pela reforma agrária. (Op. cit. p.28)
Assim,
a desterritorialização das comunidades camponesas se deu em função da
concentração da riqueza nas mãos dos grandes grupos econômicos que detêm as
tecnologias que invadiram o espaço agrário. Os cultivos de importação e a
maquinaria que invadiu o campo aumentaram proporcionalmente não somente a
produtividade agrícola, mas também a desigualdade e exclusão sociais.
A
expulsão do trabalhador do campo auxilia, sobremaneira, no aumento exponencial
da violência, desemprego e fome nos centros urbanos. Então, os movimentos
sociais no campo mostram que o desenvolvimento econômico passa necessariamente,
por uma política fundiária que vise em primeiro lugar, ao atendimento das
demandas do povo brasileiro e não os anseios das nações ditas de “Primeiro
Mundo”. O desenvolvimento de uma nação passa, necessariamente, pela erradicação
da pobreza, do analfabetismo, da fome e da miséria de sua população.
Foi
no enfrentamento de toda esta problemática que surgiram os movimentos sociais
no campo, visando resolver os conflitos e contradições provocados pelo
gigantesco deslocamento de milhões de trabalhadores da terra, despejados nas
periferias urbanas. Assim, os movimentos sociais no campo brasileiro são
fundamentais para a solução do atraso e dos equívocos de uma política fundiária
que prima pela concentração de terras e de riquezas, deixando largos
contingentes da população a mercê do descaso e do abismo incontornável da
desigualdade social e da segregação socioespacial. O eixo dos movimentos
sociais no campo, ao contrário do que muitos pensam, é a solução dos principais
problemas do campo e das cidades, os quais, uma vez solucionados, darão um
grande impulso no combate à desigualdade social e à violência urbana. Novamente
recorremos aos estudos de Fernandes (2000) para validar nossas afirmações:
Para um país como o
nosso, com muita terra e a possibilidade de desenvolvimento da agricultura
familiar, de geração de renda, de emprego, não há como evitar essa condição, que
é tão reivindicada pela população que vive e constrói essa luta. A construção
de uma política que viabilize a reforma agrária e o desenvolvimento da
agricultura familiar é urgente. É uma forma concreta de valorização da vida no
campo. O Brasil precisa aperfeiçoar a modernização da agricultura, porque nem a
indústria e nem a agroindústria vão oferecer trabalho para toda essa população.
Esta é uma questão estrutural da própria lógica do capitalismo, que não
conseguindo proletarizar a todos, recria os agricultores familiares, que antes
foram desempregados, sem-terra, etc. (Op. Cit. p.29)
Assim, Fernandes
(1999) aponta a necessidade dos movimentos sociais no campo. Eles são os canais
legítimos de enfrentamento das principais problemáticas do campo, além de apontarem
o caminho e proposições efetivas para a minimização dos impactos sociais não
somente no campo, mas, sobretudo, nas periferias dos grandes centros urbanos do
país.
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