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sábado, 14 de dezembro de 2013

A saga dos camponeses no Brasil

Foto: Prof. Dr. Valter Machado da Fonseca (2013)                        Fonte: Arquivo pessoal Prof. Valter Fonseca


Prof. Dr. Valter Machado da Fonseca
O desenvolvimento da sociedade capitalista, com o surgimento das tecnologias do campo, promoveu uma revirada espetacular nas formas e técnicas de produção agrícola, nas relações do homem com a terra e nas relações sociais no campo brasileiro. Por um lado, ela concentrou ainda mais as riquezas nas mãos dos grandes grupos e conglomerados agroindustriais e, por outro lado, aprofundou ainda mais os processos de desigualdade social e exclusão socioespacial no campo brasileiro.
Para justificar o parágrafo acima nos valemos do trabalho de (FERNANDES, 1999, p.28):

O campo brasileiro passou por profunda modernização, em alguns setores da agricultura, onde o capitalismo fincou sua mais espetacular expansão nas últimas décadas. Esse processo gerou uma extraordinária migração rural, por meio da expulsão de 30 milhões de pessoas, entre 1960 -1980, sendo que 16 milhões migraram somente na década de 70. Esse processo de transformação da sociedade moderna durou pelo menos 300 anos na Inglaterra e 200 anos nos EUA. O impacto social foi a extrema concentração urbana, o desemprego e a violência. O impacto econômico foi a implantação do parque industrial brasileiro.  

Desta forma, o denominado processo de “modernização do campo” trouxe drásticas consequências para os pequenos produtores, camponeses, extrativistas e coletores que viviam da agricultura de subsistência e dos frutos do campo. As décadas de 1960/1980 elencadas por Fernandes foram exatamente aquelas em que o campo brasileiro serviu de gigantesco laboratório para os experimentos dos pacotes tecnológicos advindos da denominada “Revolução Verde”. Estes pacotes tecnológicos, além de provocarem um violento impacto sociocultural no campo brasileiro, foram ainda responsáveis pelo despejo de incontáveis toneladas de insumos, pesticidas e agrotóxicos nos solos e nas águas do campo brasileiro. Imaginem um contingente de 30 milhões de trabalhadores rurais sendo despejados nas periferias urbanas, num espaço de tempo de apenas 30 anos. Fernandes (1999) continua sua argumentação sobre os impactos no campo brasileiro:

As transformações recentes da agricultura possibilitaram a criação da combinação agroindustrial e do desenvolvimento do cooperativismo. Todavia, essa transformação privilegiou a agricultura capitalista em detrimento da agricultura familiar, que foi renegada, banida do modelo econômico adotado pelos governos militares, situação que permanece até hoje. A modernização da agricultura capitalista, contraditoriamente, aumentou a produtividade e o desemprego. Esse fato aumentou o número de trabalhadores sem-terra, que engrossaram os movimentos sociais na luta pela terra e pela reforma agrária. (Op. cit. p.28)

Assim, a desterritorialização das comunidades camponesas se deu em função da concentração da riqueza nas mãos dos grandes grupos econômicos que detêm as tecnologias que invadiram o espaço agrário. Os cultivos de importação e a maquinaria que invadiu o campo aumentaram proporcionalmente não somente a produtividade agrícola, mas também a desigualdade e exclusão sociais.
A expulsão do trabalhador do campo auxilia, sobremaneira, no aumento exponencial da violência, desemprego e fome nos centros urbanos. Então, os movimentos sociais no campo mostram que o desenvolvimento econômico passa necessariamente, por uma política fundiária que vise em primeiro lugar, ao atendimento das demandas do povo brasileiro e não os anseios das nações ditas de “Primeiro Mundo”. O desenvolvimento de uma nação passa, necessariamente, pela erradicação da pobreza, do analfabetismo, da fome e da miséria de sua população.   
Foi no enfrentamento de toda esta problemática que surgiram os movimentos sociais no campo, visando resolver os conflitos e contradições provocados pelo gigantesco deslocamento de milhões de trabalhadores da terra, despejados nas periferias urbanas. Assim, os movimentos sociais no campo brasileiro são fundamentais para a solução do atraso e dos equívocos de uma política fundiária que prima pela concentração de terras e de riquezas, deixando largos contingentes da população a mercê do descaso e do abismo incontornável da desigualdade social e da segregação socioespacial. O eixo dos movimentos sociais no campo, ao contrário do que muitos pensam, é a solução dos principais problemas do campo e das cidades, os quais, uma vez solucionados, darão um grande impulso no combate à desigualdade social e à violência urbana. Novamente recorremos aos estudos de Fernandes (2000) para validar nossas afirmações:

Para um país como o nosso, com muita terra e a possibilidade de desenvolvimento da agricultura familiar, de geração de renda, de emprego, não há como evitar essa condição, que é tão reivindicada pela população que vive e constrói essa luta. A construção de uma política que viabilize a reforma agrária e o desenvolvimento da agricultura familiar é urgente. É uma forma concreta de valorização da vida no campo. O Brasil precisa aperfeiçoar a modernização da agricultura, porque nem a indústria e nem a agroindústria vão oferecer trabalho para toda essa população. Esta é uma questão estrutural da própria lógica do capitalismo, que não conseguindo proletarizar a todos, recria os agricultores familiares, que antes foram desempregados, sem-terra, etc. (Op. Cit. p.29)

Assim, Fernandes (1999) aponta a necessidade dos movimentos sociais no campo. Eles são os canais legítimos de enfrentamento das principais problemáticas do campo, além de apontarem o caminho e proposições efetivas para a minimização dos impactos sociais não somente no campo, mas, sobretudo, nas periferias dos grandes centros urbanos do país.

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