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sábado, 31 de janeiro de 2015

ESCASSEZ DE ÁGUA E MIGRAÇÃO HÍDRICA: UMA CRUEL REALIDADE!

Prof. Dr. Valter Machado da Fonseca (2015)



Prof. Dr. Valter Machado da Fonseca *
É notório e cientificamente comprovado que a quantidade de água existente no planeta não diminui, pois, ela é regida pelo “Ciclo da Água”, ou seja, a água que evapora em determinada localidade e/ou região vai precipitar em outra, aí poderá se infiltrar no solo abastecendo os lençóis, outra parcela poderá escoar superficialmente indo desaguar nos corpos d’água de superfície, os quais irão desaguar no oceano. Outra parte é absorvida pela vegetação e liberada pela evapotranspiração. Na verdade, o “Ciclo da Água” regula e controla a quantidade de água no planeta.
Porém, fatores externos podem fazer com que a água presente em determinada região possa migrar para outras áreas distantes, deixando regiões inteiras com grande déficits hídricos, é o que chamamos de migração hídrica. Existe a migração hídrica decorrente de fatores naturais, relacionados à dinâmica natural da Terra e há as migrações hídricas provocadas por fortes desequilíbrios ambientais, principalmente em função de ações antropogênicas (humanas) descompensatórias sobre os recursos da natureza. Vamos nos deter neste último caso em particular.
O que ocorre na Região Sudeste do nosso país é um exemplo clássico de escassez hídrica provocada por forças antrópicas (provocadas pelo homem) sobre o ambiente. A importante estiagem que marca o período atual só serve para mostrar e evidenciar a migração hídrica que já vem ocorrendo há dezenas de anos. Mas, por que ocorre a migração hídrica na Região Sudeste do Brasil?
Se olharmos o mapa das vegetações do Brasil podemos observar que a Região Sudeste se localiza bem no centro da área nuclear do cerrado brasileiro. É importante salientar que o cerrado brasileiro se configura na grande caixa d’água que abastece as principais bacias hidrográficas do continente sul americano.
Agora, se atentarmos para a história recente do nosso cerrado poderemos verificar que o bioma cerrado se transformou no principal alvo de expansão da fronteira agrícola brasileira. Seus solos foram submetidos a inúmeras experiências da grande indústria de agroquímicos, passando a servir como cobaia para experimentos de novos insumos, agrotóxicos, herbicidas e pesticidas.
Para a implantação e execução desta política de ocupação agrícola, milhares e milhares de hectares de sua vegetação original foram removidas, corpos d’água de superfície foram extintos, nascentes foram totalmente destruídas, veredas foram dizimadas, matas ciliares foram removidas, assoreamentos foram catalisados em função da retirada das vegetações ripárias, dentre inúmeros outros fatores antropogênicos que incidem sobre o agonizante cerrado. Assim, podemos afirmar que o nosso cerrado já não existe mais. O que existem são nesgas, pequenos retalhos de vegetação original, os quais já não possuem quaisquer condições de regeneração natural e mesmo artificial. Tudo isto sem dizer das centenas de espécies exóticas que foram introduzidas no bioma.
Ora, se o bioma cerrado é a grande caixa d’água da América do Sul, se nele nascem os principais rios e se formam importantes bacias hidrográficas, como é que esta valiosa riqueza de recursos hídricos pode sobreviver? Como as águas subterrâneas podem alimentar as bacias, se os reservatórios subterrâneos (lençóis e aquíferos) declinam seu nível, impossibilitando-os de alimentar as águas de superfície, pois são submetidos a altíssimos índices de impactos socioambientais em função de uma política expansionista que se preocupa apenas com os lucros facilitados e exorbitantes? Fato é que as águas subterrâneas que alimentam nossos rios e suas bacias estão baixando drasticamente de níveis. Fato é que a grande caixa d’água do continente sul americano está secando, suas águas estão literalmente migrando para outras paragens.


* Escritor. Geógrafo, mestre e doutor pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Professor e pesquisador da Universidade de Uberaba (UNIUBE). Membro e líder do grupo de pesquisas “Energia e Interações Complexas nos Ecossistemas Terrestres (GEICET) – UNIUBE/CNPq.

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