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segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Cerrado Brasileiro: Biodiversidade Ameaçada!

Vista do Cerrado (nascente do Rio São Francisco) na Serra da Canastra.
Fonte: Arquivo (Valter Machado da Fonseca 2010)
Prof. Ms. Valter Machado da Fonseca

A área contínua do cerrado encontra-se, principalmente, no planalto central do Brasil, estendendo-se por cerca de 2 milhões de Km2 e abrangendo os estados de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Rondônia, Goiás, Tocantins, Maranhão, Piauí, Bahia, Minas Gerais, São Paulo e Distrito Federal.

Em termos fisionômicos, o cerrado é uma savana tropical, um bioma em que árvores e arbustos coexistem com uma vegetação rasteira, raramente formando uma cobertura arbórea contínua.
O clima não exerce, sobre o cerrado, uma influência preponderante, predomina o tipo tropical estacional, com precipitação média anual de 1500 mm de chuva, concentrando-se mais de 90% dessa entre outubro e março.

Quanto ao solo dos cerrados, 46% deles são profundos, bem drenados e possuem inclinações leves, comumente menores que 3%. A maioria deles é rica em argila e óxidos de ferro (laterita), o que lhes dá a cor avermelhada. Aproximadamente 90% dos solos são ácidos, de baixa fertilidade (com baixa concentração de matéria orgânica, magnésio, fósforo e potássio), e alta concentração de ferro e alumínio.

Em função da heterogeneidade de solos e climas, o cerrado é extremamente rico em biodiversidade.

O cerrado tem somente 1% de sua área protegida por unidades de conservação. Para Mendonça et. al.(1998, p. 300): “o cerrado tem se mostrado muito mais rico do que se previa e muito das suas tipologias são endêmicas da América do Sul e do Brasil. Com isso, a importância de seu patrimônio genético merece maior reconhecimento”. Ainda, um levantamento feito por ele, mostra que o cerrado apresenta 6429 espécies, que incluem 451 variedades e/ou subespécies.

Enquanto o reconhecimento do cerrado não chega e não se elaboram políticas públicas, voltadas à conservação de sua biodiversidade, o cerrado perde espaço para a agricultura comercial moderna, de alta produtividade. O crescimento da demanda por produtos agrícolas e o desenvolvimento tecnológico, conjugado por políticas agrícolas, possibilitaram a ocupação máxima do cerrado. Hoje a fronteira agrícola já ultrapassa os limites do cerrado e começa a ameaçar a floresta amazônica (maior bioma brasileiro).
A quantidade total de chuvas, a temperatura amena e a energia solar abundante favorecem a utilização intensiva do cerrado e o desenvolvimento de culturas comerciais. A sua topografia e os solos, profundos e de boa drenagem, facilitam a mecanização. Sua vegetação, menos densa que a florestal, é facilmente removida. As jazidas de calcário e fosfato são abundantes e estão bem distribuídas no cerrado.

Por esses fatores, aliados à expansão de infraestrutura de transportes, de armazenagem e eletrificação rural e ao baixo preço das terras do cerrado contribuíram para, rápidas e profundas, mudanças no seu uso. “É bem conhecida a mudança espetacular que ocorreu na aptidão agrícola dos solos do cerrado no Brasil, e que consistiu na descoberta de uma solução para os problemas de baixa fertilidade natural e elevada acidez”, afirma Rezende (2002, p. 1). A melhor aptidão agrícola dos cerrados foi favorecida pela descoberta de novas variedades de sementes, como as de soja e milho.

Devido a todos esses fatores descritos acima, a ação antrópica sobre o cerrado avançou num ritmo espetacular. A fronteira agrícola avançou de forma desenfreada ameaçando, sobremaneira, a biodiversidade do bioma. Das milhares de espécies da fauna campestre, centenas estão em fase de extinção e outras já estão extintas. A introdução das espécies vegetais exóticas (eucalipto, pinus, gramíneas) vem causando um sério desequilíbrio no bioma.
O uso da mecanização, com equipamentos pesados vem provocando a compactação do solo, favorecendo processos de erosão, e lixiviação dos nutrientes do solo, através do escoamento superficial das águas. Todo esse impacto sobre a fauna e o solo do cerrado vem acompanhado do desmatamento das matas ciliares, cabeceiras e nascentes dos rios e córregos, aliados ao acúmulo de lixos domésticos e resíduos industriais provenientes das cidades. O caráter predatório desse manejo, nas três últimas décadas, chama a atenção para a necessidade de uma prática sustentável do bioma.

As preocupações com os efeitos da ação antrópica sobre os biomas terrestres são bastante recentes e datam da década de 1970 no diagnóstico do clube de Roma. O conceito atual de desenvolvimento sustentável é decorrente da evolução das noções de ecodesenvolvimento trabalhadas na primeira conferência das Nações Unidas sobre meio ambiente, realizada em Estocolmo, 1972. O conceito de desenvolvimento sustentável é aquele que “atende as necessidades do presente, sem comprometer as possibilidades das gerações futuras de atenderem  às suas próprias necessidades” (CMMAD, 1991).

Essa concepção de desenvolvimento não deixa de ser problemática, à medida que é portadora da noção de balanço entre as necessidades humanas e a capacidade do meio ambiente de atendê-las, colocando, portanto, o homem como centro da vida no planeta e não como uma simples parte desse conjunto.

A proteção da biodiversidade é um fator fundamental para que o desenvolvimento sustentável do cerrado seja atingido. Nesse bioma, deve ser enfatizada a preservação de sua capacidade de recuperação, após a ocorrência de perturbações, e papel de sua biodiversidade neste processo.

Entretanto, nas três últimas décadas, pelo menos 50% dessa biodiversidade já foram convertidas em áreas de pastagens ou de exploração agrícola intensiva, particularmente, culturas de soja e milho. A substituição de uma vegetação rica em espécies de fauna e flora, por uma graminosa ou por alguma forma de monocultura, certamente, traz grandes alterações ecológicas a este vasto e frágil bioma.

A sustentabilidade do cerrado depende da preservação de sua capacidade de recuperação, após a ocorrência de perturbações, daí o papel da conservação de espécies nativas e de sua biodiversidade, em um contexto de massiva introdução de espécies exóticas, que alteram os ciclos biogeoquímicos, modificam o regime de fogo, e são competidoras de espécies nativas, podendo levá-las à extinção reduzindo a biodiversidade do bioma.

Portanto, para se atingir um desenvolvimento sustentável no cerrado, há que se considerar suas particularidades ambientais, econômicas e sociais, propor políticas de conservação e utilização de sua biodiversidade, que se levem em conta o papel da cultura e as práticas seculares dos pequenos agricultores, pecuaristas e coletores, que garantiram, até recentemente, o mesmo padrão de ocupação dos cerrados.

domingo, 20 de fevereiro de 2011

Desafios da presidente Rousseff para a educação (1)

Prof. Ms. Valter Machado da Fonseca*
No dia 1º de janeiro de 2011 iniciou-se mais um mandato presidencial no Brasil. A presidente eleita pelos brasileiros tem pela frente enormes desafios e obstáculos, mas também inúmeras possibilidades para mostrar ao conjunto do povo brasileiro que é possível construir sobre bases sólidas, medidas que possibilitem a melhoria das condições de vida da população, principalmente de sua parcela mais carente.
Do conjunto de propostas feitas por Dilma Rousseff em diversas áreas, como habitação, transportes, geração de empregos, saúde, educação, saneamento, políticas urbana e agrária, meio ambiente, dentre várias outras, quero dar visibilidade e destaque especial às propostas na área da educação. Em um dos meus artigos publicados pelo JM, ainda no período eleitoral, destaquei alguns aspectos que considerava importantes para o conjunto de candidatos [desde os deputados, passando por senadores até presidente da nação] no campo da educação. Na ocasião chamei à atenção para a viabilização de propostas que visassem à melhoria da qualidade da educação e da moralização dos concursos públicos para servidores e docentes da educação pública no país [em níveis municipal, estadual e federal]. Quero, neste artigo, me deter na problemática dos concursos públicos, deixando outras questões para futuros artigos. Priorizo, neste momento, os concursos públicos, devido à gravidade da temática.
Os concursos públicos foram institucionalizados como mecanismos de seleção de servidores e docentes das instituições públicas de ensino no país, visando à necessidade sentida pelo conjunto do povo brasileiro de normatizar a contratação dos profissionais da educação pelas instituições públicas de ensino, combatendo o nepotismo, a corrupção, o desvio de verbas e a arbitrariedade que reinavam na escolha de funcionários para o setor. Mas, parece que, com o decorrer do tempo, as “panelinhas” que se formaram nas instituições públicas de ensino encontraram maneiras de burlar e controlar os concursos e, ao mesmo tempo manipular os resultados dos processos seletivos. E, mais que isso, elas vem se formando e se consolidando no seio destas instituições, constituindo-se em verdadeiros “feudos institucionalizados” que mapeiam os concursos públicos e “dividem o bolo” segundo o interesse de grupos que se beneficiam com tal prática, contrária ao processo de democratização de nossas escolas e universidades. Assim, a proposta que visava à democratização das instituições públicas de ensino, na prática vem se transformando em instrumento que tem por objetivo manter os privilégios de diversos grupos que se encastelaram no interior de nossas instituições de ensino no país [municipais, estaduais e federais]. E, o pior de tudo, é que esses grupos falam em nome da “autonomia das escolas e universidades” do Brasil. Em nome de ideais democráticos, constroem práticas que abrem caminho para a manipulação e deterioração dos concursos públicos.
E não é preciso ir longe para detectar essas práticas ilícitas. Aqui mesmo, em Uberaba, ao longo do ano de 2010, tivemos exemplos claríssimos desses desmandos em instituições federais de ensino. Esses grupos se apropriam das instituições mantidas a duras penas com o dinheiro do povo brasileiro, em benefício próprio. Estas imoralidades não atingem somente os candidatos comprometidos com a educação de qualidade e que se inscrevem nestes concursos, mas, sobretudo, é uma afronta ao povo brasileiro que as mantém com o dinheiro originado de seus impostos.
Esse é um grande desafio a ser enfrentado, de imediato, pela presidente Rousseff. Se ela quer, de fato, colocar em prática suas propostas em prol de uma educação de qualidade em todos os níveis, ela deve atacar, de forma imediata, as raízes dessa problemática, garantindo legitimidade, transparência e democracia no trato da coisa pública no Brasil. De nossa parte, ao longo, ainda, deste semestre, formaremos uma comissão e estaremos juntando provas e evidências que demonstram os desmandos nos concursos públicos, as quais serão entregues, em mãos, ao ministro da educação e à própria presidente da República Federativa do Brasil, Dilma Rousseff. É preciso, urgentemente, passar a limpo a escola e os concursos públicos no Brasil, se, de fato queremos construir uma educação de qualidade em todos os níveis.  


* Escritor. Graduado em Geografia pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU), mestre e doutorando em Educação também pela UFU. Professor da Universidade de Uberaba (UNIUBE). machado04fonseca@gmail.com

EDUCAÇÃO EM DISCUSSÃO: A escola passada a limpo

Prof. Ms. Valter Machado da Fonseca*

Hoje, em meus devaneios de toda madrugada, um assunto que me vem, constantemente, à memória voltou a me inquietar. O crônico e histórico problema da educação brasileira voltou a me perturbar.  Talvez, o motivo do aumento da frequência da inquietação sobre esta temática esteja relacionado à aproximação do processo eleitoral deste final de 2010.
Como de costume, em todos os processos eleitorais no Brasil, esta temática entra em voga, e se agiganta, cada vez mais, à medida que as eleições se aproximam. Não existe tema mais preferido por todos que pleiteiam cargos [do legislativo ao executivo, passando pelo judiciário] do que a educação. O recente e justo movimento grevista dos professores da Rede Estadual de Ensino veio trazer novos e importantes elementos para aumentar, ainda mais, minhas inquietações.
Todos os candidatos que pleiteiam cargos [em todos os escalões] do governo, em seus palanques eleitorais, fazem verdadeiras apologias à educação. E não falam de qualquer educação, falam em nome de um ensino de qualidade em todos os níveis, como se a escola pudesse sanar todos os problemas sociais, econômicos e culturais do país [inclusive o mau caratismo, a improbidade administrativa, as maracutaias, os desvios de verbas e as diversas formas de corrupção].
Reexaminando os editais que regem os concursos públicos que visam “selecionar” os melhores candidatos nas instituições Federais, Estaduais e Municipais de Ensino em nosso país, podemos verificar discrepâncias e lacunas que permitem a manipulação desses concursos, dirigindo-os para os candidatos preferenciais de alguns “iluminados”, os mesmos que sobem nos palanques eleitorais em defesa de uma educação de qualidade. Afinal, para que servem os concursos públicos? Servem para selecionar, de fato, os melhores e mais capacitados candidatos para os cargos disponíveis, ou servem apenas como instrumento de manobra para beneficiar alguns concorrentes? Em diversos locais do nosso imenso território surgem, a todo o momento, evidências e provas cabais de manipulações dos concursos públicos.
Se quisermos, de fato, construir uma educação de qualidade no Brasil, os governos devem voltar os olhos para os editais, critérios, composições de bancas de examinadores e processos de avaliação e seleção dos melhores candidatos para ocuparem os cargos colocados à disposição na educação pública, em todos os níveis [das escolas municipais às universidades estaduais e federais].  Por fim, para se efetivar no país uma educação verdadeiramente de qualidade, os nossos governantes e representantes devem se preocupar com todas as questões envolvidas no processo educacional brasileiro, a iniciar por um reexame dos formatos dos concursos públicos que escolhem os candidatos a docentes e funcionários de nossas escolas e universidades.  É preciso, urgentemente, passar a limpo o rascunho da proposta dos concursos públicos no Brasil.


* Valter Machado da Fonseca é Mestre e Doutorando em Educação pela Faculdade de Educação da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). É professor da Universidade de Uberaba (UNIUBE).

A cultura e a contracultura

Prof. Ms. Valter Machado da Fonseca*
Caros (as) leitores (as)!
Hoje, me dirijo a vocês para falar de uma angústia que vem crescendo, continuamente, nos tempos presentes. Gostaria de falar um pouco acerca dos meus devaneios, quase frequentes nas madrugadas frias de inverno. O assunto que ora me atormenta é o processo cultural [ou contracultural] no qual estamos submersos até o pescoço. O que é cultura, afinal? Na sociedade moderna é difícil [para não dizer impossível] respondermos a esta indagação. Observando os noticiários, a música, a dança, enfim, diversas formas de exprressões atístico-culturais, vemos uma pseudocultura construída sob o marketing da sociedade de consumo. Uma cultural enlatada! Acho que essa é a expressão correta.
Quando Caetano Veloso se referia ao “lixo ocidental” em suas belas canções, ele se referia ao rejeito, à sucata, às sobras de uma produção cultural americanizada e europeizada, de forma forçada e, cujo destino final eram as mentes e os corações africanos e latinoamericanos. Caetano, Gil, Chico Buarque, Edu lobo, João Bosco, Belchior, dentre outros, chamavam à atenção num movimento pós Tropicália, para os perigos de nos deixarmos engolir por essa contracultura que surgiu da lama gosmenta americanizada e europeizada. Uma cultura que não servia para eles, mas que queriam empurrar para nós, assim com tentaram fazer, recentemente, com seus containers de lixo. Quero deixar claro que defendo a ideia de uma cultura universal, sem fronteiras, enfim, uma cultura para a liberdade. Porém, nunca defendi o acolhimento universal ou localizado de rejeitos da contracultura estrangeira.
Hoje, basta olhar os enlatados da TV, do rádio, das revistas e dos jornais para percebermos a invasão sistemática não da cultura originada simplesmente do “lixo ocidental”, mas advinda do “lixo”, proveniente do “lixo ocidental”, ou seja, “o lixo do lixo ocidental”. Os perigos sobre os quais nos alertavam Chico Buarque e seus amigos estão aí, invadindo, escancaradamente, nossas casas, nossos corações e nossas mentes. Na barbárie da sociedade atual, assistimos à gestação de uma sociedade acéfala e aculturada, reprodutora da contracultura do culto ao consumismo e ao descartável. Presenciamos o nascimento de uma sociedade, na qual os valores culturais se edificam sobre a podridão de um sistema necrosado e decadente, onde o inimigo mortal do homem é o próprio homem.
Mas, será que tudo está perdido? Eu afirmo que não. No meio de toda essa contracultura gosmenta, em meio ao “lixo do lixo ocidental” podemos verificar que existem pessoas que criam a boa música, a boa literatura, a boa dramaturgia. Em nossa região e, em especial em nossa cidade, temos legítimos representantes de uma cultura autêntica e que reflete os valores artístico-culturais originais de nosso povo. Mas, para isso é necessário que saibamos garimpar. Esses expoentes culturais de nossa gente estão perdidos no meio do “lixo do lixo ocidental”. É preciso que os encontremos e estendamos-lhes as mãos, antes que eles sejam tragados pelo “buraco negro”, obscuro, sem fim, da contracultura gosmenta americanizada e europeizada. Faz-se urgente que os salvemos do “lixo do lixo ociedental”.     


* Escritor. Ténico em Mineração, Graduado em Geografia, Mestre e Doutorando em Educação pela Faculdade de Educação da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Professor da Universidade de Uberaba (UNIUBE).

sábado, 19 de fevereiro de 2011

TRIÂNGULO MINEIRO: A ONDA “AMARGA” DA MONOCULTURA DA CANA-DE-AÇÚCAR INVADE O CERRADO.

Prof. Ms. Valter Machado da Fonseca
Depois da soja, assiste-se à ofensiva impiedosa da monocultura da cana-de-açúcar invadir o cerrado brasileiro (ou as manchas que ainda restam dele). No Triângulo Mineiro, em particular, esta invasão tem assumido proporções gigantescas. Assiste-se, agora acompanhada da tecnologia de última geração, ao retorno da monocultura que marcou o início do processo de colonização do Brasil. O discurso em defesa desta monocultura traz em suas entrelinhas argumentos que tentam apagar da memória do povo brasileiro, as marcas de um período, não tão distante, de degradação ambiental, de torturas, de escravidão e de exploração dos negros e indígenas desta terra, ainda majestosa.
É importante, aqui, destacar um trecho de Francisco Graziano Neto:

Sobre a devastação ocorrida com o ciclo da cana-de-açúcar no Nordeste, desde o século XVI, assim se manifesta Galeano, baseando-se em Josué de Castro: “O açúcar arrasou o Nordeste. A faixa úmida do litoral, bem regada por chuvas, tinha um solo de grande fertilidade, muito rico em húmus e sais minerais, coberto por matas tropicais da Bahia até o Ceará. Esta região de matas tropicais converteu-se, como diz Josué de Castro, em região de savanas. Naturalmente nascida para produzir alimentos, passou a ser uma região de fome. Onde tudo germinava com exuberante vigor, o latifúndio açucareiro, destrutivo e avassalador, deixou rochas estéreis, solos lavados, terras erodidas [...]. Os incêndios que abriam terras aos canaviais devastaram a floresta e com ela a fauna; desapareceram os cervos, os javalis, as toupeiras, os coelhos, as pacas e os tatus. O tapete vegetal, a flora e a fauna sacrificadas, nos altares da monocultura, à cana-de-açúcar. A produção extensiva esgotou rapidamente o solo”. (GRAZIANO NETO, 1986, p.94)
O trecho extraído da obra de Graziano Neto refere-se à formulação de Josué de Castro, um dos maiores especialistas e estudiosos, acerca da temática da seca do Nordeste. “Geografia da Fome”, talvez tenha sido a obra de Castro que mais se aprofunda nos estudos das desigualdades sociais que marcam as regiões brasileiras, principalmente o Nordeste do Brasil.
Este pequeno fragmento de texto, contido na obra de Graziano Neto, expressa com muita propriedade os danos causados ao solo por este tipo de monocultura. Na época do Brasil Colônia, a preocupação com a preservação dos solos era pequena, justamente pela abundância de terras virgens; quando uma área ficava comprometida, era simplesmente abandonada e se partia para a predação de outras áreas. Quantas vezes já se presenciaram a prosa entre antigos agricultores, quando da derrubada das matas para novos plantios: “Terras cheias de vida, gordas”, diziam. Sobre essas terras “cheias de vida”, pouco se pode dizer, nos dias atuais. Elas se transformaram em simples substrato de sustentação de plantas e que exigem técnicas artificiais e cada vez maiores quantidades de agrotóxicos, para produzirem.
  A prática da monocultura deixa o solo totalmente exposto. O sintoma mais aparente e conhecido da degradação dos solos agrícolas é a erosão. Ela não é um fenômeno natural, embora a intensidade das chuvas e a declividade do terreno possam influir sobre sua ocorrência. Sua origem verdadeira é a infiltração deficiente da água no solo, por alterações ou perda de sua bioestrutura e/ou por um manejo incorreto. É interessante notar que nas matas ou nos campos naturais (o que restam deles), não há perda de solos, mesmo após os mais violentos temporais. As águas dos rios de floresta são sempre límpidas.
O discurso em favor da monocultura da cana-de-açúcar se embasa na criação de novos empregos (diretos e indiretos), maiores salários, bem-estar para as famílias pobres (leia-se miseráveis), além de gerar divisas para o país e propiciar a produção do álcool, como forma de energia limpa e barata (?).
Ora, o que a mídia tem destacado ao longo dos anos é exatamente o contrário. Páginas inteiras de jornais, matérias inteiras no rádio e na TV, têm vinculado as práticas da monocultura da cana à exploração da mão-de-obra infantil, a torturas e prostituição infantil nos canaviais, a trabalhos escravos e semi-escravos e, até à morte de trabalhadores rurais ligados a esta atividade. Recentemente, a Rede Globo de Televisão exibiu no “Fantástico” (horário nobre), uma série de reportagens onde mostrava estes aspectos em várias regiões do país. Destacou entrevistas com usineiros da Região Sudeste, os quais se vangloriavam que os cortadores de cana do Sudeste conseguiam um salário de até R$800, 00, enquanto no Nordeste ganhavam metade deste valor. Só que estes senhores se “esqueceram” de dizer que para ganhar este salário, cada trabalhador tem que cumprir uma jornada de trabalho de até 12 (doze) horas por dia, cerca de 15 Toneladas de cana cortada/trabalhador/dia, sem direito a descanso semanal. A TV Globo mostrou vários casos de trabalhadores (cortadores de cana) que morreram por fadiga e/ou por estafa objetivando perseguir este “exorbitante” salário.
Quanto à forma de energia limpa, deve-se questionar: quantas toneladas de agrotóxicos são despejadas nos canaviais? Quantas centenas de milhares de hectares de cerrado e quantos milhões de toneladas de biomassa são destruídas para produzir esta “energia limpa”? Quantas espécies de plantas e animais são extintos com este tipo de monocultura? E a energia barata, onde está? Com certeza, vai para garantir os lucros, cada vez mais exorbitantes, dos usineiros. E sobre estes (os usineiros), o que se pode dizer? São as mesmas famílias, gerações advindas da centenária oligarquia rural nordestina. São os mesmos que até os dias atuais mantêm seus currais eleitorais, por intermédio da famigerada “indústria da seca”. São os mesmos ligados às atividades do garimpo clandestino, os mesmos que, ainda mantêm vivos os resquícios do feudalismo no país, os mesmos ligados à “grilagem” de terras no Norte e Centro Oeste do Brasil, ligados a assassinatos de centenas de trabalhadores rurais e dezenas de suas lideranças. São a estes fatos e a esses “senhores de escravos” (hoje escravidão dissimulada e legalizada), que se liga a monocultura da cana-de-açúcar no país.
No Triângulo Mineiro, em particular, esta prática se propaga como rastilho de pólvora. Quando se passa nas rodovias da meso-região do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba, já não se vê mais o cerrado, pelo contrário, se vêem centenas de milhares de hectares do extinto cerrado, ocupado pelo plantio da cana. A monocultura que se alastrou, nos dias atuais, através da soja, agora começa a perder espaço para a cana-de-açúcar.
Os pequenos produtores rurais, não conseguindo acompanhar a tecnologia agroindustrial que invade o campo e/ou não conseguindo arcar com os preços impostos pelos oligopólios de insumos e equipamentos agrícolas, se vêem obrigados a arrendar suas terras (por 30, 40 ou 50 anos) para os usineiros. Estes despejam milhares de toneladas de agrotóxicos e insumos para aumentarem a produção e, ao cabo de, aproximadamente, 30 anos tornam as terras estéreis. Aí, devolvem-nas para os pequenos produtores. Arrendam terras produtivas e devolvem “pedaços de deserto”. Toda essa prática tem sido feita, sem nenhum Estudo de Impactos Sócio-Ambientais.
A monocultura da cana tem extinguido espécies endêmicas (da fauna: diversas espécies animais, desde mamíferos, répteis, aves até roedores e flora: árvores frutíferas, flores e espécies de madeiras) do cerrado, exterminando, assim, as atividades das famílias coletoras e das que viviam da agricultura de subsistência. Tudo para dar lugar à especulação da monocultura, para atender as demandas dos países chamados de “primeiro mundo”. Em nome desta monocultura os grandes conglomerados sucro-alcooleiros se sentem no direito de remover a vegetação nativa do bioma cerrado, destruir nascentes dos rios e riachos, além de destruir as matas ciliares, que protegem as margens dos mananciais. No município de Delta (Triângulo Mineiro – MG), e até mesmo em Uberaba (MG), existem plantações de cana-de-açúcar a cinco metros das margens do Rio Grande, um dos principais rios do país.
A prática da monocultura da cana, como já foi comprovada, causa a perda de água do solo, modifica sua textura e porosidade, ocasionando a formação de solos estéreis, ressecados, em vias de desertificação. Nesta última década, em particular, a monocultura da cana-de-açúcar já, quase que triplicou sua produção, no entanto, o consumidor da chamada “energia limpa” em nada foi beneficiado, basta verificar os preços do álcool nos postos de combustíveis. Quanto ao açúcar, basta olhar o preço do produto nas prateleiras dos supermercados.
A prática desta monocultura visa, em primeira instância, atender aos anseios e ganâncias dos usineiros e, em segunda instância os interesses dos fabricantes e das montadoras de automóveis. O Brasil continua com a mesma visão de quase quinhentos anos atrás, no que se refere á produção agrícola. O país vive de especulações sobre os tipos de monoculturas que atendem aos anseios do mercado internacional, principalmente os EUA, a Europa e Ásia, não importando com a demanda de seu mercado interno, nem com os interesses da maioria de seu povo, que fica à mercê dos preços impostos pelas grandes empresas agroindustriais multi/transnacionais.
Ironicamente, a mídia fala de responsabilidade sócio-ambiental, de educação ambiental e de proteção do Planeta, quando as ações dos governantes, empresários e instituições oficiais, primam pela defesa das monoculturas e da desertificação de grandes extensões de nosso território. É preciso aqui, rediscutir os conceitos de educação e de natureza, é preciso discutir, urgentemente a dimensão Ambiental da Educação.
A Educação (Ambiental) deve ser capaz de romper a camisa de força que a mantém aprisionada a velhos e falsos conceitos, que em última instância visam às reformas dentro dos marcos do capital. Hoje, existe uma gama de organismos oficiais, ONG’s, ambientalistas, ecologistas e correntes pedagógicas que se reivindicam do debate ambiental. Os “especialistas” do complexo campo de investigação das temáticas ambientais repetem, por caminhos diferentes, os mesmos discursos. Pensar na degradação ambiental de forma coerente e séria, é pensar na complexidade ambiental, é descartar os discursos superficiais do “politicamente correto”, da “preservação da ararinha azul, do mico leão dourado ou do boto cor de rosa”, do “ecologicamente correto” do “tomar consciência de”, pelo contrário, é assumir a (re)flexão epistemológica sobre a relação natureza-sociedade, é levar às últimas conseqüências este debate. A problemática ambiental é uma questão política, e, como tal deve ser tratada. Tratar das temáticas ambientais é rediscutir os verdadeiros significados de democracia, cidadania, de (des)envolvimento. Não se pode exigir daqueles colocados à margem da utilização dos recursos naturais, a aceitação de padrões preestabelecidos por aqueles que se utilizam, a seu bel prazer, dos recursos da natureza, como forma de mercantilizá-la, colocando-a a serviço da reprodução irracional do capital e, gerando o bem estar social para uma pequena parcela da população mundial.
Neste sentido, o Brasil têm uma enorme responsabilidade, justamente por sua extensão territorial (dimensão continental). É necessário inverter a lógica de sua produção agrícola, o país deveria desenvolver a rotação de culturas, diversificação de espécies cultivadas, plantio direto, agricultura orgânica, enfim, saber conservar o patrimônio genético natural com o qual a natureza, sabiamente, privilegiou o país. Do contrário, dentro de pouco tempo o verde do continente Sul Americano, perderá seu esplendor e dará lugar ao marrom/ocre que caracteriza as regiões desertificadas.
Por fim, é necessário envolver a sociedade, as comunidades acadêmico-científicas, a sociedade civil organizada, enfim, os vários setores representativos da população brasileira, num sério debate, onde se coloque no centro das discussões a problemática da prática das monoculturas, visando buscar formas alternativas de uso e manejo corretos do solo e dos demais recursos naturais, não perdendo de vista as necessidades da população brasileira, bem como a busca de novas formas alternativas no trato das relações sociedade-natureza.
REFERÊNCIA
GRAZIANO NETO, F. Questão Agrária e Ecologia: crítica da moderna agricultura. 3. ed. São Paulo: Brasiliense, 1986. Cap. II, p.93-134.

O PLANETA EM CHAMAS: A Terra responde ao vírus da prepotência humana

Prof. Ms. Valter Machado da Fonseca


O “Aquecimento Global” é o tema do momento. Mas, desta vez não se trata de mais um “modismo”, como aconteceram em várias oportunidades com o sensacionalismo dado pela rede de comunicação de massas, inúmeras vezes, às temáticas ambientais. Vários estudiosos sérios, de diversos ramos das ciências da Terra, há muito já chamavam a atenção para o drástico grau de enfermidade do planeta. O planeta dá claros sintomas de seu estado febril, de seu estado de agonia.
Mas não se trata de uma febre qualquer, mas de uma reação ao vírus da prepotência humana. A terra responde da única forma que lhe resta, com a única alternativa que lhe é oferecida. Quando um organismo de qualquer forma de vida encontra-se em estado febril, com a conseqüente elevação de temperatura, é sintoma da existência de alguma infecção, de algum elemento pernicioso ao seu funcionamento, ou, simplesmente, uma reação à presença de quaisquer corpos estranhos, incompatíveis, contraditórios com seu metabolismo. O aquecimento dos corpos é o sintoma da reação dos anticorpos que agem para expulsar os vírus estranhos, que podem ser letais para esses organismos, podendo levá-los à morte. Isto ocorre com a saúde do Planeta, ele está febril.
A situação está tão séria que o inatingível George W. Bush, o “juiz supremo da humanidade”, aquele que paira sobre o conjunto dos povos, como “polícia do mundo”, pasmem: o mesmo que há poucos anos se recusou a assinar o Protocolo de Kioto, já admite reduzir em 20% a emissão de poluentes para a atmosfera. A rendição do “Senhor da Guerra” diante dos fatos é outra evidência do grau de enfermidade da Terra.
Não existe mistério para explicar o “Aquecimento Global”, os fatos falam por si mesmos. O homem experimentou o paladar saboroso do lucro proporcionado com a exploração desmedida dos recursos da natureza e, acreditou que não existiam limites para sua ganância. Afinal de contas, a natureza existe para servi-lo, unicamente para isso, imagina ele, na sua infinita e “infalível racionalidade”. Afinal, a terra pode suportar tudo, ela é “matéria morta”, “natureza inanimada”, não possui a infinita capacidade de raciocínio do Homo sapiens. E é, exatamente contra este vírus letal da prepotência humana, que a Terra reage e lança seus anticorpos. O avanço sem precedentes da tecnologia, a racionalidade técnica e científica dão poderes ilimitados à prepotência gananciosa da espécie humana. É dentro deste contexto que o Planeta reage.
Mas, a reação do Planeta é altamente democrática. Ele não separa os “homens bons” dos “homens maus”, os sensatos dos insensatos, os ricos dos pobres, os poderosos dos miseráveis, pelo contrário, sua ira atinge todos os homens indistintamente. Esta é sua suprema e sábia democracia. A “natureza morta”, que o homem acreditava dominar e explorar dá mostras de sua força, de sua sapiência, de sua vida, de sua supremacia. E é sob esta ótica que este texto pretende debater e discutir o fenômeno do “Aquecimento Global”. É dentro desta lógica que se pretende construir este texto, desnudando a hipocrisia humana, colocando às claras sua prepotência e irracionalidade.
1 O que é o progresso e o desenvolvimento que a humanidade tanto cultuam?
Para iniciar este tópico é importante recorrer à brilhante formulação de Carlos Walter Porto Gonçalves (2004):

Com a questão ambiental estamos diante de questões de claro sentido ético, filosófico e político. Que destinos dar à natureza, à nossa própria natureza de seres humanos? Qual é o sentido da vida? Quais os limites da relação da humanidade com o planeta? O que fazer com o nosso antropocentrismo[1] quando olhamos do espaço o nosso planeta e vemos como ele é pequeno e quando entendemos que somos apenas uma dentre tantas espécies vivas de que nossas vidas dependem? (GONÇALVES, 2004, p.18)

A citação de Gonçalves leva à reflexão sobre as relações da humanidade com a natureza, com o Planeta. Tudo hoje se justifica em nome do “progresso” e do (des)envolvimento.
 Que progresso é este, que se justifica por meio da destruição do planeta? Que progresso é este, que para se sustentar tem que destruir vidas alheias?
 Que desenvolvimento é esse que leva continentes inteiros à situação de miséria, para sustentar o bem-estar social das nações ditas desenvolvidas? Que desenvolvimento é esse, onde as nações “desenvolvidas” utilizam as nações pobres como depósito de lixo? Que desenvolvimento é esse, onde as nações para demonstrar supremacia econômica têm que produzir armamentos nucleares, transformando o planeta num depósito de lixo atômico?
 A humanidade precisa responder, urgentemente, a estas questões, se quer, realmente, alcançar o tão almejado “progresso” e o tão cobiçado “desenvolvimento”. Para se alcançar o bem-estar, é preciso primeiro compreender o significado da vida.
É notório que a problemática ambiental acirrou-se, basicamente, a partir da Revolução Industrial e, seus efeitos mais gritantes começaram, de fato, a serem percebidos a partir da década de 1960, quando o Planeta começou a dar respostas às agressões contra ele dirigidas. Estas respostas vieram na forma de grandes catástrofes, às quais o homem chama de “naturais” como: o efeito estufa, o buraco na camada de ozônio, as “chuvas ácidas”, o aumento considerável na temperatura e no nível dos oceanos, o aquecimento global, as alterações climáticas, as grandes enchentes, maremotos, furacões, terremotos, o derretimento das calotas polares, dentre outras.
Desta forma, a necessidade da reflexão sobre os laços que unem a sociedade à natureza se faz urgente, no sentido de se evitar o colapso total. É preciso resgatar, acima de tudo, o verdadeiro significado da vida, significado este há muito perdido diante da lógica irracional da ação do homem sobre a natureza. É preciso o entendimento de que a vida vai muito além da existência ou não do homem: vai desde suas formas mais simples até as mais complexas.
 A própria legislação desvirtua o sentido da vida, ao resgatar o homem como centro do universo, esta visão antropocêntrica demonstra a miopia política que reveste o ser humano e, ao mesmo tempo legitima as suas ações degradantes sobre a natureza, permitindo a exploração de seus recursos a seu bel prazer, não importando as conseqüências dessas ações.
2 O sertão pode virar mar, o mar pode virar sertão!
Diferentemente do que propagam os veículos de comunicação de massa, a terra é um sistema complexo, vivo, dinâmico. Apesar de sua aparência estática, o planeta Terra está sempre em movimento, seguindo sua própria dinâmica, a qual, por sua vez, está em sintonia com a dinâmica do universo. Desta forma, a Terra se movimenta e está em constante transformação, daí, pode-se afirmar que o planeta não é estável, o que significa que ele pode construir um novo desenho em suas estruturas e até mesmo na disposição dos continentes em seu mapa. Assim como num passado não muito remoto, geologicamente falando, os continentes se desmembraram, em curto espaço de tempo eles podem, novamente, adquirir novo desenho, nova configuração. Tudo depende da correlação entre as forças internas e externas que atuam sobre o planeta. Por isso, as teorias que afirmam que a Terra já atingiu sua estabilidade, ou caminha para ela, não se constituem numa verdade. O desaparecimento de uma espécie inteira de seres vivos, os dinossauros, é um fato cientificamente comprovado.
A dinâmica é o movimento da terra, onde cada força, que incide sobre este movimento, interage com outra força, no sentido de garantir o frágil e complexo equilíbrio do grande ecossistema global. Assim, existem forças que atuam internamente sobre a Terra e aquelas que atuam na porção externa do planeta. Por isso, diz-se que a Terra possui uma dinâmica interna e outra externa.
Existem cinco elementos fundamentais para a manutenção do equilíbrio do ecossistema terrestre, interdependentes e interligados entre si, são eles: o sol, água, atmosfera, clima e organismos. Estes cinco elementos atuam, diretamente, sobre a dinâmica da terra regulando-a, são primordiais para a manutenção do equilíbrio do ecossistema planetário, bem como para garantir a continuidade de todas as formas de vida no ambiente terrestre. A interferência brusca e desordenada sobre estes elementos, seja em seu conjunto ou sobre cada um deles separadamente, pode ser letal para a saúde ambiental do planeta. O fenômeno do aquecimento global interfere, diretamente, sobre estes elementos, principalmente sobre a atmosfera. A intervenção humana sobre a atmosfera contribui, de forma decisiva, para as alterações climáticas e, conseqüentemente para o “Aquecimento Global”.
3 Aquecimento Global: um dos maiores problemas ambientais de todos os tempos.
O fenômeno do “Aquecimento Global” nada mais é do que o resultado da interferência gananciosa do homem sobre o ambiente. O homem começa a colher os frutos de sua própria imprudência. A própria Física explica brilhantemente este fenômeno, que é resultado do desequilíbrio do conjunto de forças que sustentam o ecossistema planetário. “A cada ação corresponde uma reação, de mesmo módulo e sentido contrário”.
O processo de desenvolvimento industrial, a fabricação de automóveis em série, os desmatamentos, as queimadas, a prática das monoculturas e a urbanização desordenada, estes fatores deram início à poluição atmosférica, por meio da emissão de gases nocivos para a atmosfera, a exemplo do monóxido de carbono (CO), dióxido de carbono (CO2), o metano e óxido nitroso.
A emissão de gases poluentes para a atmosfera tem aumentado, de forma nunca vista, o número e o agravamento de doenças respiratórias, além do aparecimento de novas doenças. A emissão desses gases provoca o chamado efeito estufa, que tem influência direta sobre o “Aquecimento Global”.
O efeito estufa é provocado fundamentalmente pela emissão de poluentes (principalmente gases tóxicos) para a atmosfera. As grandes fontes de emissão destes gases são os automóveis, as queimadas (provocadas e espontâneas), os desmatamentos, a queima de combustíveis fósseis pelos grandes pólos industriais. Dentre estes, os automóveis têm um papel decisivo, pois circulam sem nenhum controle, muitas vezes em condições precárias e aumentam em quantidade, quase que de forma exponencial. Estima-se, segundo fontes das Nações Unidas que a população mundial, nos dias de hoje, atinja a casa dos 6,5 bilhões de habitantes, a frota de automóveis atinja a casa de 725 milhões e a emissão de gás carbônico (CO2) para a atmosfera atinja a marca de 7,3 bilhões de toneladas (Fonte: Organização das Nações Unidas, 2006). Estes números demonstram bem o tamanho do problema e a dimensão dos estragos causados pela queima dos combustíveis fósseis e seus derivados. Na verdade, segundo a opinião da própria ONU, este já é um quadro quase que irreversível.
O “efeito estufa” se forma pelo acúmulo de gases tóxicos na atmosfera da Terra. O gás carbônico (CO2) e outros gases formam uma espécie de capa na atmosfera que funciona como uma estufa: permite a entrada de raios solares, mas retém parte do calor refletido pela superfície terrestre, que de outra forma se dissiparia no espaço. Isso manteria a temperatura amena e permitiria a vida na Terra. A poluição provocada pelo homem aumenta a concentração de gases do efeito estufa, rompendo o equilíbrio climático. O descontrole na produção de automóveis, de atividades industriais e agroindustriais, as queimadas, a remoção da vegetação, dentre outros fatores, aumentam, de forma drástica, a quantidade de poluentes emitidos para a atmosfera agravando, cada vez com mais intensidade, o problema do efeito estufa. O efeito estufa interfere de forma direta nas alterações climáticas e no “Aquecimento Global”, um dos maiores problemas ambientais, detectado nestes últimos tempos.
O Brasil, apesar de defender a diminuição da quantidade destes gases poluentes, ocupa um lugar de destaque (4º lugar, com 5,4% da emissão total de gases poluentes) no ranking dos países que mais poluem a atmosfera planetária, os EUA ocupam o 1º lugar, com 15,8% do total. É importante destacar que, para a poluição atmosférica não existem fronteiras, pois as massas de ar se deslocam tanto verticalmente como horizontalmente. Desta forma a poluição atmosférica produzida no Brasil atinge também outros países e vice-versa. Portanto, qualquer ação de combate a este tipo de poluição, tem que envolver o conjunto de países responsáveis por ela, caso contrário elas não terão nenhum efeito.
KLINTOWITZ, 2006 destaca algumas sérias conseqüências, às quais ele chama de “as seis pragas do aquecimento”, são elas:
1 – O derretimento do Ártico: A cobertura de gelo da região no verão diminui ao ritmo constante de 8% ao ano há três décadas. No ano passado, a camada de gelo foi 20% menor em relação à de 1979, uma redução de 1,3 milhões de quilômetros quadrados, o equivalente à soma dos territórios da França, da Alemanha e do Reino Unido.

2 – Os furacões estão mais fortes: Devido ao aquecimento das águas, a ocorrência de furacões das categorias 4 e 5 – os mais intensos da escala – dobrou nos últimos 35 anos. O furacão Katrina, que destruiu Nova Orleans, é uma amostra dessa realidade.

3 – O Brasil na rota dos ciclones: Até então a salvo desse tipo de tormenta, o litoral sul do Brasil foi varrido por um forte ciclone em 2004. De lá para cá, a chegada à costa de outras tempestades similares, ainda que de menor intensidade, mostra que o problema veio para ficar.

4 – O nível do mar subiu: A elevação do nível dos oceanos, desde o início do século passado está entre 8 e 20 cm. Em certas áreas litorâneas, como algumas ilhas do Pacífico, isso significou um avanço de 100 m na maré alta. Um estudo da ONU estima que o nível das águas suba 1 metro até o fim do século. Cidades à beira-mar como Recife, precisarão de diques de contenção.

5 – Os desertos avançam: O total de áreas atingidas por secas dobrou em trinta anos. Um quarto da superfície do planeta é agora de desertos. Só na China, as áreas desérticas avançam 10.000 km2/ano, o equivalente ao território do Líbano.

6 – Já se contam os mortos: A organização das Nações Unidas estima que 150.000 pessoas morram anualmente por causa de secas, inundações e outros fatores relacionados diretamente ao aquecimento global. Em 2030, o número dobrará. (KLINTOWITZ, 2006, p.76-77)
  
4 Para não concluir: considerações parciais.

Os mais antigos não precisavam de previsão do tempo, diziam: hoje vai chover, chovia. É tempo de plantar, plantavam e colhiam. Hoje vai esfriar, esfriava. Hoje vai dar boa pesca, pescavam o peixe fresco.
Mas, hoje o homem tenta prever o imprevisto. Tem seca na Amazônia, morrem milhões de peixes. Tem enchente no Nordeste e seca no Sul. Tem inundação pra todo gosto, no Norte, no Sul, Sudeste, Centro-Oeste, Nordeste. Tem furacão, Tsunami, terremoto, tornados, pragas, chuva ácida, muitas doenças (novas e a volta das antigas). E, o homem, ainda, tenta jogar a culpa na natureza. Enquanto isso continua fabricando milhões de automóveis, desmatando a Amazônia, desertificando o Nordeste e o Sul, brigando por petróleo, contaminando as águas e os solos.
Nos tempos modernos, transformações que a natureza levaria centenas, milhares e até milhões de anos para processar, acontecem em poucos anos, ou até mesmo em dias, sob a ação humana. O planeta está seriamente enfermo. Estudos mostram a gravidade do atual estágio de degradação ambiental do planeta, ao mesmo tempo em que apontam para soluções incertas e duvidosas. Cientistas chegaram à desoladora conclusão que a problemática do “Aquecimento Global” tornou-se um processo irreversível. Chegaram a afirmar que a floresta amazônica vai virar savana, o cerrado (as manchas que ainda restam), os campos e o sertão do semi-árido vão virar desertos.   Chegaram mesmo a afirmar que a espécie humana, tem um comportamento inédito (no sentido de destruição e desequilíbrio), dentre todas as espécies, cujas vidas já foram registradas no planeta, em todos os tempos.
 A espécie humana, apesar de possuir apenas alguns segundos de existência, geologicamente falando, já causou danos e estragos nunca dantes conhecidos. Estas mesmas pesquisas apontam para a extinção da espécie humana em apenas mais alguns segundos (em tempo geológico) de existência sobre a face da Terra. Após a extinção do homem, a terra, com certeza, se recomporá de uma forma mais saudável, sem a ameaça da existência humana. Aí, a Terra terá conseguido levar a cabo sua reação, terá expulsado de seu organismo, da forma mais dolorosa, o vírus pernicioso da prepotência humana, o grande responsável por suas enfermidades e seu estado febril.
5 Referências:
GONÇALVES, C. W. P. O desafio ambiental. Emir Sader (org.). Rio de Janeiro: Record, 2004. __ (Os porquês da desordem mundial. Mestres explicam a globalização).

KLINTOWITZ, J. APOCALIPSE JÁ. In: Rev. VEJA. 1961 ed. Ano 39. Nº. 24 de 21 de junho de 2006, p. 68-83.

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU). Relatórios ambientais oficiais, 2006.


[1] Grifo meu. Antropocentrismo refere-se à concepção da corrente filosófica que considera o homem como o centro do universo.

“DISCURSO DO MÉTODO”: Entre o ponto e o contraponto

Prof. Ms. Valter Machado da Fonseca

Introdução
Quando se propõe estudar o pensamento de determinado filósofo ou pensador, está se propondo a si mesmo o livre exercício de pensar. Pensar com o outro, pensar com o próprio pensamento perpassando o pensamento do outro. Não basta, para isso, se contentar em repetir o discurso de um determinado pensador. É preponderante analisar, traduzir, profundamente, este discurso, verificar o que está implícito em suas entrelinhas, observar o que não está presente, o que não está representado, o que está oculto no discurso manifesto.
O que buscava Descartes no “Discurso do Método”? Ele procurava um método que fosse eficaz, que pudesse dar conta da explicação científica. Para ele a metodologia científica da época era incapaz de explicar os fenômenos científicos, era cheia de lacunas e levavam a dúvidas, equívocos e erros. [...] “me encontrava embaraçado com tantas dúvidas e erros que me parecia não haver conseguido outro proveito, procurando instruir-me, senão o de ter descoberto cada vez mais dúvidas” (DESCARTES, 2009, p.3). Percebe-se neste fragmento textual, a descrença com os ensinamentos, com os métodos de ensino da época. Por outro lado, ele já demonstrava sua tendência e inclinação em validar a linguagem matemática como universal para enunciar sua metodologia:
Deleitava-me principalmente com as matemáticas, devido à certeza e à evidência de suas razões: mas ainda não percebia sua verdadeira explicação, e, julgando que só serviam às artes mecânicas, espantava-me de que, sendo seus fundamentos tão seguros e sólidos, não se houvesse construído sobre eles nada de mais elevado (idem, p.4)
Neste sentido, ele se apropriou da linguagem matemática para fundamentar sua metodologia. O primeiro ponto que se pode concluir é que os princípios cartesianos tiveram suas bases ancoradas nas incertezas do pensamento humano.
1 O princípio da razão absoluta
Para edificar as bases do seu discurso metodológico Descartes adota os fundamentos da matemática, pela sua exatidão, pela sua linguagem “segura”, para o exercício intelectual do ser humano. Acreditava-o, que dessa forma eliminaria os erros, equívocos e ilusões. Ao adotar tais princípios, ele acaba fragmentando a ciência, ou seja, descarta todo o conhecimento produzido fora do discurso matemático. Aí ele acaba por jogar por terra as diversas concepções de mundo, de vida, de idéias filosóficas acerca do pensamento social. E estas idéias filosóficas foram construídas a partir de onde? Foram elaboradas a partir do pensamento humano, isto é, do intelecto, do cérebro, portanto, da própria razão de cada indivíduo. Eis aí a primeira grande contradição de Descartes.    
Porém, ele precisava de elementos que lhe dessem a base inicial de seu discurso. Esses elementos ele buscou, exatamente, na abstração do pensamento, aspecto por ele rejeitado: ele buscou na teologia, na “verdade revelada”. Mais uma vez ele joga por terra o pensamento científico, pois descarta a fonte inicial da pesquisa, as interrogações. Assim, de forma consciente, afirma que a sua teoria da razão absoluta, baseada nas certezas matemáticas tem sua origem na verdade revelada. Neste sentido, a ciência possui sua origem em tal verdade, eis aí outra grande contradição.
1.1        Penso, logo existo!
Não basta pensar para ser, como afirmava Descartes, e, desta maneira, interpretado por Félix Guattari (1990, p.17):
O sujeito não é evidente: não basta pensar para ser, como o proclamava Descartes, já que inúmeras outras maneiras de existir se instauram fora da consciência, ao passo que o sujeito advém no momento em que o pensamento se obstina em apreender a si mesmo e se põe a girar como um pião enlouquecido, sem enganchar em nada dos territórios reais da existência, os quais por sua vez derivam uns em relação aos outros, como placas tectônicas sob a superfície dos continentes.

Concordando com Guattari (1990), esta visão cartesiana restringe a existência na Terra apenas aos seres pensantes, ou seja, ao próprio ser humano. Esta afirmação acaba por formalizar uma perspectiva estreita e homocentrista[1]. Esta máxima do pensamento cartesiano acaba por excluir da existência todos os seres vivos, além dos recursos necessários à sua sobrevivência. Neste sentido, o homem se coloca, de uma vez por todas acima de todos os seres vivos. Em última instância, acima da natureza, podendo fazer dela o que quiser e a seu bel prazer, ameaçando, inclusive a própria continuidade da existência humana no planeta.
2       O contraponto
Como foi dito no início deste ensaio, para se analisar uma obra, é preciso lê-la com criticidade, interpretar as entrelinhas de seu discurso. Ora, a ciência se constrói exatamente em cima das incertezas. Pode-se afirmar que as incertezas e os questionamentos estão na base do pensamento, do exercício intelectual do ser humano, assim, estão na base do pensamento científico. Não se pode evoluir na construção de novos conhecimentos se não existe dúvidas e indagações, conforme afiança Edgar Morin (2005):
As ciências permitiram que adquiríssemos muitas certezas, mas igualmente revelaram, ao longo do século XX, inúmeras zonas de incerteza. A educação deveria incluir o ensino das incertezas que surgiram nas ciências físicas (microfísicas, termodinâmica, cosmologia), nas ciências da evolução biológica e nas ciências históricas. Seria preciso ensinar princípios de estratégia que permitiriam enfrentar os imprevistos, o inesperado e a incerteza, e modificar seu desenvolvimento, em virtude das informações adquiridas ao longo do tempo. É preciso aprender a navegar em um oceano de incertezas em meio a arquipélagos de certeza. (MORIN, 2005, p.16) 

A contribuição de Morin (2005) é uma importante ferramenta para, ao mesmo tempo, entender e fazer o contraponto ao “Discurso do Método” de Descartes. Ela dá subsídios para a apreensão dos elementos e aspectos que precisam ser investigados para a compreensão da ciência moderna, além de auxiliar na percepção das entrelinhas do discurso cartesiano.
O professor Humberto Guido também faz uma importante formulação a este respeito:
Defensores da igualdade natural, os adeptos da teoria do conhecimento atribuíram à matemática a responsabilidade de tornar ato aquilo que existe desde sempre em potência, não em um indivíduo singular, mas na espécie como valor formal, este é um dos paradoxos da modernidade, um tempo em que se afirmou a dignidade do indivíduo, contudo, as afirmações sobre suas possibilidades eram sempre gerais sem considerar as condições sociais díspares em que se encontravam divididos os diversos estamentos sociais. A refutação da tradição foi a abertura que permitiu que se colocasse para fora da esfera educativa todos os conhecimentos que não se adequassem imediatamente ao more geométrico. (GUIDO, 2005, p.4)

Complementando a formulação de Guido (2005), este modelo vem se apropriando, cada dia mais, deste discurso “igualitário”, que analisa o “sujeito” (o homem) e o “objeto” (a natureza), como coisas que podem ser moldadas e trabalhadas segundo os padrões da técnica e do cientificismo. Na verdade, o saber sempre foi privilégio das minorias e das elites intelectuais, aspecto que obteve relevância desde as primeiras escolas dos filósofos da Grécia antiga.
Dessa forma, o processo histórico de construção do conhecimento é permeado por uma gama de fatores que camuflam, disfarçam, dissimulam o discurso que determina os conteúdos desses conhecimentos. Nesse sentido, o conhecimento está, intrinsecamente, ligado ao poder político e econômico que emana das elites que ditam os destinos da humanidade em cada período da história da civilização humana.
3       Referências
MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à educação do futuro. Trad. Catarina Eleonora F. da Silva e Jeanne Sawaya. 10 ed. São Paulo: Cortez; Brasília, DF: UNESCO, 2005.
GUIDO Humberto. As ciências Humanas, entre o engajamento e o compromisso. Texto final de fechamento da disciplina Epistemologia e Educação, 2005, 14 pags. (mímeo)
DESCARTES, René. DISCURSO DO MÉTODO. Trad. Enrico Corvisieri. Digitalização: Membros do grupo Acrópolis (filosofia). Disponível em: http://br.egroups.com/group/acropolis/. Acesso em 25 de janeiro de 2009.
GUATTARI, Félix. As três ecologias. 16 Ed. Trad. Maria Cristina F. Bittencourt. Campinas, SP: Papirus, 1990.


[1] Diz-se homocentrismo à corrente filosófica que situa o homem como o centro do universo.