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quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Deus e o diabo na terra do sol

Fonte: iatidadepressao.blogspot.com
Prof. Dr. Valter Machado da Fonseca*
Este título da obra clássica de Glauber Rocha serve perfeitamente para ilustrar o que vem ocorrendo no planeta Terra em função das alterações climáticas as quais são, sistematicamente, aceleradas pelas ações antropogênicas (humanas). Verificamos nestas últimas décadas o deslocamento das forças naturais que atuam sobre a Terra, em decorrência das ações desorganizadas do ser humano, em especial sobre as formações vegetais e os recursos hídricos.
Na mesorregião do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba este desequilíbrio das forças naturais que atuam sobre o planeta pode ser constatado pelas forças de reação caracterizadas pelo atual desequilíbrio climático, pelo rebaixamento do lenções freáticos e pela quase extinção de importantes corpos d’água de superfície (rios, riachos, córregos e ribeirões). O exemplo mais ilustrativo é o caso do Rio Cantareira (SP), onde já podemos observar o fundo da calha do rio e as rochas expostas que compõem o seu leito natural.
Estes eventos de desequilíbrio climático vêm em função de um amplo processo de desflorestamento do cerrado brasileiro, visando à expansão da fronteira agrícola, objetivando atender à ganancia da agricultura de exportação, em especial o plantio exaustivo da cana-de-açúcar, com imensos despejos de toneladas de insumos e agrotóxicos que se infiltram no solo e acabam atingindo os lençóis que abastecem os corpos d’água de superfície. Isto sem mencionar os gigantescos volumes de vinhoto (vinhaça) produzido pela cadeia produtiva da cana.
O cerrado brasileiro (a grande caixa d’água da América do Sul) vem sendo bombardeado pelos pacotes tecnológicos deste os anos dourados das décadas de 60/70 visando ao cultivo das monoculturas tipo exportação, para o atendimento dos mercados norte americano e europeu. Este violento ataque aos recursos naturais do nosso cerrado tem provocado também violentos impactos socioambientais sobre o bioma com o consequente deslocamento das forças naturais que mantêm o frágil equilibro deste ecossistema. Neste sentido, a diminuição da evapotranspiração (pela remoção das formações vegetais), o descarte gigantesco de imensos volumes de agrotóxicos e insumos (de forma direta ou indireta) acaba por contaminar as principais fontes de água potável à disposição do consumo humano. Por outro lado, a intervenção antropogênica desordenada sobre os recursos dos diversos biomas brasileiros, força o deslocamento das forças naturais que regulam o equilíbrio climático do planeta, promovendo, desta forma, os gravíssimos processos de alterações climáticas, para os quais existem limitados números de soluções minimizadoras. Diante disso, o “Deus natureza” trava uma batalha com o diabo (homem) na terra do sol. Esta talvez seja a derradeira guerra que o ser humano consiga travar neste planeta ainda azul.


* Escritor. Geógrafo, mestre e doutor pela Universidade Federal de Uberlândia. Professor e pesquisador das temáticas “Alterações Climáticas” e “Impactos socioambientais sobre os ecossistemas terrestres e aquáticos”. E-mail: pesquisa.fonseca@gmail.com

domingo, 23 de fevereiro de 2014

MIRAGEM

Fonte: www.panoramio.com
Por Valter Machado da Fonseca

A paisagem árida, escaldante, ensolarada
Não relembra os tempos de outrora
Tempos do sussurro das águas correntes
Do canto alegre do pintassilgo ao amanhecer
O sol saudava o dia com raios fulgurantes
O entardecer se despedia na aurora escarlate

À noite o frescor do vento sibilante
Acariciava as árvores com afagos delirantes
Nas pedras a cascata azul espumante
Acariciava a mata com o estrondo do som alegre
O tempo preparava o rito exuberante
Do novo dia despindo a paisagem deslumbrante

Agora, lá longe muito longe, bem distante
No barraco de tábuas, papelão e sucata
Chora calado, com rosto queimado, o desolado retirante
No peito a dor explode em soluços silenciosos
Lá embaixo não é o sol que alegrava o pintassilgo
Mas, a selva de pedra, encoberta pelo pó

No alto, nuvens negras, fumegantes
Escondem o sol com a mortalha do terror
O fugitivo com olhar sombrio de um ser sofrido
Chora relembrando os tempos de outrora
No seu semblante estão as marcas envelhecidas
Da esperança que o tempo apagou, sem compaixão.

O sol que virá enegrecido, encoberto com o manto negro
Não anuncia esperança, nem algo novo, exuberante
Mas trás consigo a rotina da batalha
Dos marginais eu se esforçam todo dia
Para que na aurora, na volta pra seu canto
Sonhar de novo os pesadelos cotidianos

Lá na paisagem árida...escaldante
Não existe os tempos de outrora
Do pintassilgo só sobrou a lembrança
Do seu canto como um eco no horizonte
O que restou da sua terra dos tempos de outrora
Foi o pio triste, da saudade do retirante

Pior seca em 50 anos muda vida da população às margens do Cantareira

Fonte:  Hélvio Romero/Estadão (2014)

Fonte:  Hélvio Romero/Estadão (2014)

Fonte:  Hélvio Romero/Estadão (2014)
Por NTV
Agricultores perderam suas safras e ficam à espera de um caminhão-pipa da prefeitura, famílias convivem com cheiro de esgoto, poços e minas estão secos e hoje há mato e pedras onde antes havia represas e cachoeiras. Agricultores de Itapeva, no sul de Minas, que perderam a safra de milho dependem hoje de duas visitas semanais de caminhões-pipa para conseguir tomar banho e cozinhar. As minas e poços secaram à medida que o nível do Jaguari também baixava. 'Aqui nós não temos água mais. Tínhamos um poço para quatro famílias, de 25 metros de profundidade, que secou. O milho não teve adubo que resolveu, ficou pequeno demais. Perdemos tudo', conta a agricultora Irene Gercina, de 69 anos.
O Rio Jaguarí chega em Joanópolis/SP e forma um grande reservatório. A agonia de quem vive do Jaguarí pode ser observada desde as nascentes do manancial, no sul de Minas, até seu encontro com o Rio Camanducaia, em Jaguariúna, na região de Campinas. A vazão, que chegou a 50 metros cúbicos por segundo nas cheias de 2010, hoje está em 11 m³/s.
Em um grande condomínio de luxo à beira do rio Jaguari, um píer na encosta do morro mostra onde antes era o nível da água. No condomínio em Joanópolis foi necessário o alongamento da rampa para permitir o acesso a embarcações na água. Quatro anos após as enchentes que obrigaram mais de 6 mil pessoas a deixar suas casas na região do Circuito das Águas, no interior paulista, a pior estiagem em 50 anos mudou a vida da população às margens dos principais mananciais do Estado. Moradores do bairro “Estivinha” são abastecidos por caminhão pipa da prefeitura porque os poços artesianos estão com o nível muito baixo. 'Nem os lambarizinhos conseguem mais nadar, está muito raso mesmo. Estou com medo é de quando chegar o inverno. Aí, sim, o Jaguari vai sumir de vez', lamenta o agricultor Salmo Ceni, de 49 anos, todos vividos às margens do Jaguari.
Disponível em: http://estadao.br.msn.com/fotos/sistema-cantareira#image=7 Acesso em: 23 de fevereiro de 2014.

sábado, 22 de fevereiro de 2014

A NATUREZA RESPONDE À ALTURA!

Fonte: www.feemjesus.com.br
Valter Machado da Fonseca*
Nesta virada de 2013/2014 estamos presenciando uma das piores estiagens dos últimos 50 anos na Região Sudeste do Brasil. Já ultrapassamos meados de fevereiro de 2014 e a chuva praticamente desapareceu exatamente num período em que, costumeiramente, estamos habituados a grandes picos de precipitações pluviométricas. Por incrível que pareça, sabemos de relatos de caminhões pipas levando água potável para fazendas do Triângulo Mineiro.
Mas, o que significa de fato, esta estiagem?  É normal períodos de estiagem em quaisquer épocas do ano. Porém, o que foge à normalidade é a frequência e o modo com estas estiagens vêm ocorrendo pelo país afora. Verificamos desde anos passados (2009/2010/2011/2012) picos elevadíssimos de temperatura que fogem da média e dos padrões normais para o verão. Observamos, já ao longo de duas décadas, a ocorrência constante e frequente de enormes catástrofes no período de chuvas, culminando com enormes alagamentos, enchentes e inundações, combinados com a ausência daquelas precipitações lentas e longas que permitem a infiltração correta das águas no solo. Pelo contrário, assistimos a processos de precipitações descontroladas (como as frequentes chuvas de granizo) que culminam com torrentes d’água fortíssimas sobre o solo provocando erosões (ravinas e voçorocas), escoamentos superficiais violentos com completa lixiviação dos nutrientes do solo.
Enquanto os debates no IPCC continuam para saber se os grandes eventos climáticos recentes são ou não frutos da ação antropogênica sobre os recursos naturais, as grandes catástrofes climáticas se alastram por todo o planeta, de forma cada vez mais violenta, sem nenhuma forma de prevenção e/ou controle. É a natureza respondendo aos ataques violentos e insensatos contra ela desferidos! Enquanto a sociedade se digladia em debates infrutíferos que não levam a quaisquer ações efetivas, a natureza age e tira do homem, pouco a pouco, o líquido da vida: a água potável. Talvez esta seja a única forma que possa levar o ser humano a um processo sério de reflexões sobre suas ações insensatas na face deste planeta. É preciso torcer para que o momento em que a sociedade consiga acordar já não seja tarde demais para a continuidade da espécie humana no planeta Terra. Aí, talvez seja o extermínio definitivo do homem e o recomeço de uma nova vida para a Terra!        


* Escritor. Geógrafo, mestre e doutor pela Universidade Federal de Uberlândia. Professor e pesquisador das temáticas “Alterações Climáticas” e “Impactos socioambientais sobre os ecossistemas terrestres e aquáticos”. E-mail: pesquisa.fonseca@gmail.com