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Fonte: oraculodealexandria.blogspot.com (2015) |
Prof. Dr. Valter Machado da
Fonseca
Quando o escritor
francês Antoine de Saint-Exupéry escreveu esta frase em “O Pequeno Príncipe”
ele levantou uma das mais importantes reflexões que se arrastaria pelos séculos
afora e que iria fazer com que a humanidade se indagasse sobre si própria. Esta
célebre frase abre importante reflexão acerca das diferenças entre a essência e
a aparência. Existe enorme diferença, um abismo, enfim, uma profunda distância
entre “ver” e “enxergar”.
Esta frase que já
nasceu com toda sua contemporaneidade, se torna ainda mais atual nos tempos
presentes. Nos tempos onde o homem cria desejos e necessidades artificiais e se
esquece, definitivamente, dos valores e das necessidades reais. Nesses tempos
de hoje, nesta sociedade, o homem anula a realidade e iguala, de forma
altamente cruel, a essência à aparência. Isto nos leva a buscar, outra vez, as
reflexões contidas na frase de Saint-Exupéry: o que significa “ver” e o que
significa “enxergar” o mundo e as coisas do mundo? Para que serve a vida se
estamos sendo moldados para jamais buscar a nossa essência no mundo? Para que
serve a vida, afinal, se estamos sendo moldados para nos contentarmos com a
aparência do mundo e das coisas do mundo, aparência construída por poucos e que
está totalmente distante de nossa verdadeira essência? Querem nos fazer crer
que a essência de uns poucos tem que servir para muitos. Querem transformar a
verdadeira essência do homem em aparência, em coisas, é a coisificação do homem,
do mundo, da vida.
Por isso, o simples
ato de “ver” está totalmente distante do nobre ato de “enxergar”. “Ver” o mundo
e as coisas do mundo é simplesmente se contentar em admirar, é se estagnar na
tranquila postura de observar o mundo apenas em sua aparência, recusando-se a
buscar sua essência. Já o ato de “enxergar” o mundo é procurar por sua
significação, é fugir da cômoda postura de simples admirador. É procurar,
constantemente, por sua verdadeira função, seu real papel no mundo e, não
simplesmente se contentar em admirá-lo. É também procurar a sua própria
significação no “outro” que também compartilha contigo este mundo e as coisas
do mundo. Qual é a sua relação com o outro neste mundo? Qual é a significação
de termos a capacidade de raciocínio, de criação dentro deste mundo? Para que
serve esta capacidade superior? Serve apenas para admirar o mundo e as suas
coisas? Ou, será que serve para atuarmos neste mundo buscando, incessantemente,
transformá-lo? Diante da nossa sublime capacidade de compreensão, de criação,
de transformação, o simples dom da observação mecânica, estática, perde
totalmente o sentido. Por isso, o “pequeno príncipe” jamais se abdicava de suas
interrogações. Por isso, ele jamais desistia de buscar suas respostas. Ele não
se contentava com o simples ato mecânico de “ver” o mundo, ele queria
“enxergar” o mundo. Ele jamais se contentava com a mera aparência, ele sempre
perseguia a busca da verdadeira essência de estar, de existir neste mundo.
Assim, Saint-Exupéry,
num texto que muitos afirmam ter sido feito para a infância, nos mostra de
maneira altamente adulta que a aparência não passa do simples indício da
existência de uma real essência. Que o dom de “ver” o mundo nos indica que é
necessário evoluirmos para a sublime condição de “enxergar” o mundo, buscando,
incansavelmente sua transformação. Aí, nos indica que devemos abominar as
afirmações como “se nascemos assim é porque assim deve ser”, ou “as coisas
sempre foram assim”. São posturas como essas que transmitem a alguns poucos a sensação
de que podem moldar a grande maioria, de que podem criar desejos, necessidades
segundo sua própria vontade. São posturas como essas que fazem com que poucos
se sintam no direito de criar aparências segundo sua medíocre essência [agora
sem aspas]. Por fim, meu caro (a) leitor (a), o que mais existe neste mundo são
pessoas que possuem os olhos perfeitos, uma visão incrivelmente perfeita,
porém, não são capazes de enxergar absolutamente nada.