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segunda-feira, 3 de junho de 2013

Insetos de vida longa são mistério para a ciência

Fonte: The New York times (2013)
Por NTV
Os motoristas que ficam atrás do carro de John Cooley logo perdem a paciência. Dirigindo pelo leste dos Estados Unidos com as janelas abertas, de vez em quando o pesquisador diminui a velocidade, para e ouve com bastante atenção, registrando as informações em um computador preso ao assento do passageiro. Cooley é biólogo evolucionário da Universidade de Connecticut, em Storrs, e está na estrada mapeando as populações periódicas de cigarras (do gênero Magicicada). As larvas desses insetos barulhentos e de olhos vermelhos passaram os últimos 17 anos maturando e emergiram este mês aos bilhões, para algumas semanas de cantoria e sexo antes de morrerem.
Assim como o punhado de outros pesquisadores de cigarras entre a Carolina do Norte e Nova York, Cooley sabe que precisa trabalhar com rapidez. 'O tempo é nosso inimigo por aqui, tanto para as cigarras quanto para os pesquisadores', afirmou. 'Se perdermos essa oportunidade, ficaremos sem informações e precisaremos esperar mais 17 anos.'
Com os mais longos ciclos de vida conhecidos, os insetos do gênero Magicicada confundem os cientistas há séculos. Em 1665, o primeiro volume da Philosophical Transactions of the Royal Society, uma das revistas científicas mais antigas do mundo, incluía um relato da Nova Inglaterra a respeito de 'enxames de insetos estranhos e dos estragos causados por eles'. Charles Darwin também escreveu a respeito desses insetos e até os dias de hoje os entomologistas tentam entender como esses ciclos de vida peculiares evoluíram, como os insetos contam os anos e como sincronizam suas agendas. 'Eles são um dos maiores mistérios ecológicos da atualidade', afirmou Walt Koenig, ecologista comportamental do Laboratório de Ornitologia da Universidade de Cornell, em Ithaca, Nova York. Eles também são uma raridade entomológica. Das milhares de espécies de cigarras conhecidas no mundo todo, só existem sete do gênero Magicicada que vivem no leste e centro dos Estados Unidos e evoluíram ciclos de vida tão prolongados e sincronizados.
Na margem sul de seu território, as populações de Magicicada se dividiram em três grupos de espécies mistas que emergem a cada 13 anos; já na região norte, há 12 grupos com ciclos de 17 anos. A ninhada deste ano pertence ao Grupo II, um dos maiores grupos com ciclos de 17 anos e que emerge em grandes áreas metropolitanas da costa leste.
Desde a última vez que foram para a superfície em 1996, as cigarras do Grupo II passaram por cinco estágios larvais debaixo da terra, onde sobreviveram se alimentando dos fluídos de raízes de árvores. Com as temperaturas altas deste mês, as ninfas têm emergido para realizar a última muda e ganhar asas. Com densidades populacionais de até 350 indivíduos por metro quadrado nas florestas, o coro das cigarras pode ultrapassar os 95 decibéis – alto o bastante para machucar os ouvidos humanos – enquanto os machos tentam atrair as fêmeas. Depois de cruzarem, as fêmeas fazem buracos nos galhos de árvores, onde depositam os ovos. Após seis a dez semanas, quando os ovos eclodirem, o chão estará forrado com os corpos de seus pais. A nova geração de ninfas irá cair no chão, cavar buracos no solo e ficar ali até 2030. Os biólogos geralmente concordam que o surgimento sincronizado e maciço de cigarras periódicas acaba com as chances de possíveis predadores, permitindo que ao menos alguns desses insetos relativamente indefesos se reproduzam. Além disso, alguns pesquisadores sugerem que as cigarras evoluíram ciclos de vida em torno de números primos, uma vez que isso limitaria a chance de que os predadores entrassem em sincronia. Contudo, essas teorias não explicam por que as gerações duram especificamente 13 ou 17 anos.
Koenig sugere que a resposta pode envolver interações com pássaros. Ele e Andrew Liebhold, do Serviço de Florestas dos Estados Unidos em Morgantown, West Virginia, analisaram 45 anos de dados da Pesquisa de Reprodução de Pássaros da América do Norte e revelaram que as populações costumam cair em torno dos anos nos quais as cigarras periódicas emergem. Os pássaros se alimentam de cigarras, de forma que Koenig esperava ver um padrão oposto. Ele sugere que as massas de cigarras causem mudanças de longo prazo nas florestas, o que leva as populações de pássaros a caírem a cada 13 ou 17 anos. O mecanismo ainda é um mistério, mas Koenig destaca que um dos fatores poderia ser o grande volume de cigarras mortas, cujos corpos são compostos por 10 por cento de nitrogênio. A hecatombe libera um fluxo de fertilizante no solo da floresta, o que aumenta temporariamente o crescimento das plantas, mas pode levar a condições menos favoráveis aos pássaros depois de um tempo. 'É uma hipótese maluca', admite.
Para sincronizar a maturação, as ninfas devem ter alguma forma de contabilizar o tempo que passaram debaixo da terra. Gene Kritsky, entomologista do College of Mount St. Joseph, em Cincinnati, Ohio, afirmou que as ninfas parecem contar o número de vezes que as árvores ganham novas folhas na primavera; em 2007, algumas cigarras do Grupo XIV emergiram um ano mais cedo, após um forte degelo, durante o qual as árvores produziram folhas, perderam-nas novamente e voltaram a produzi-las na primavera seguinte. Contudo, ninguém sabe ao certo como as cigarras se 'lembram' do número de anos desde a última vez que emergiram.
Os pesquisadores estão fazendo mais progresso na investigação dos mecanismos biológicos que permitem que as cigarras mudem os ciclos de vida. Em uma análise de marcadores de DNA publicada este ano, uma equipe da qual Cooley participou desenvolveu uma árvore evolucionária para o gênero Magicicada e descobriu que os principais grupos se dividiram repetidamente entre bandos com ciclos de vida de 13 ou 17 anos. Os pesquisadores sugerem que essas divisões podem ser explicadas por um mecanismo genético comum entre as espécies.
Chris Simon, uma das coautoras e bióloga evolucionária da Universidade de Connecticut, planeja acompanhar os resultados com diversos estudos genéticos, incluindo o sequenciamento das transcrições de RNA de genes que são ativos em diferentes estágios do ciclo de vida da cigarra. Simon está particularmente interessada em investigar a tendência ocasional de algumas cigarras que emergem quatro anos mais cedo ou mais tarde. Essas 'retardatárias' são presas fáceis e quase nunca sobrevivem, mas Simon e outros sugerem que são esses erros que podem ter dado origem a novos grupos no passado. 'É uma forma de obter uma especiação instantânea', afirmou. 'Essa capacidade de dar saltos temporais é algo que nunca foi observado em outros organismos.'
Um exemplo dessa 'viagem no tempo' pode estar ocorrendo agora mesmo no centro-norte de Cincinnati, a pelo menos 500 quilômetros de distância da área do Grupo II. Kritsky documentou o aparecimento de milhares de cigarras na semana passada, em um local onde foram avistadas cigarras em 2000, quatro anos antes de a cidade ser inundada pelas cigarras com ciclos de 17 anos do Grupo X.
A chegada das cigarras no mesmo lugar este ano pode indicar que uma mudança ambiental como o aquecimento global esteja levando os insetos a emergirem mais cedo, ou então que um fator genético levou alguns membros do Grupo X, de 17 anos, a mudarem para um ciclo de vida de 13 anos, de acordo com Kritsky. O pesquisador precisa esperar mais quatro anos para saber se algumas das cigarras de 2000 voltaram para o ciclo de 17 anos. Contudo, o maior fluxo do Grupo X irá ocorrer em 2021. Até lá, Kritsky terá 68 anos de idade. As longas gerações de cigarras periódicas dificultam o estudo, afirmou. 'Você pode pensar que temos muitas respostas, mas isso não é verdade. Pouquíssimos pesquisadores puderam testemunhar cinco gerações.'

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