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sábado, 6 de julho de 2013

CÚPULA DOS POVOS: na “RIO+20” por justiça social e ambiental


Larissa Ambrosano Packer*

A Rio + 20 aconteceu 20 anos depois da ECO/92, onde vários países do mundo se encontraram para discutir temas sobre a conservação do meio ambiente e a biodiversidade . Porque em 1992 eles se reuniram para fazer isso? Só para conservar o meio ambiente? Ou a biodiversidade, porque ela é importante pelo seu valor de existência para o planeta e para a humanidade?
Bom, alguns países tinham essa intenção somente, mas uma grande parte dos países, principalmente os países desenvolvidos que tem sua cadeia de produção, suas indústrias que dependem dos recursos genéticos que vêm da biodiversidade precisam ter uma reserva de biodiversidade, principalmente as indústrias de biotecnologia. Eu estou falando da “Monsanto”, que desenvolve sementes, eu estou falando da “Bayer”, que desenvolve medicamentos e sementes, da “Syngenta”, que desenvolve agrotóxicos, sementes e medicamentos também.
Então, muitas empresas e monopólios agroalimentares, dependem de algumas matérias primas só encontradas nos países megadiversos, ou seja, nos países que têm muita biodiversidade. O Brasil, por exemplo, é um país que contém a maior biodiversidade do planeta. Nós temos 13% da biodiversidade do planeta. Isso significa fazer várias vacinas, novas sementes, novos químicos genéticos, etc., isso na visão dos países desenvolvidos. Então, falar de natureza e meio ambiente, não é falar que está todo mundo só abraçando árvore, porque queremos somente proteger os recursos naturais pelo seu valor de existência.
Na ECO/92 foram firmados as três grandes convenções: a Convenção da Diversidade Biológica, a Convenção sobre Desertificação, para evitar o avanço dos desertos e a convenção sobre  mudanças climáticas. Isso foi em 1992. O Protocolo de Kyoto, que é o protocolo que determina limites máximos de emissões para os países que sempre emitiram, foi firmado em 1997. Então, os países mais desenvolvidos que sempre poluíram, tem que ter limites sobre suas emissões. Só que ao invés de você criar mecanismos de conservação, tanto no protocolo de Kyoto, da CTB, etc., o que houve nesses 20 anos de avaliação, é os países conseguirem aproximar a biodiversidade do comercio e conservar a biodiversidade muito pouco. Então, a conservação da diversidade biológica e os objetivos ecossistêmicos do milênio, etc., chegou a conclusão que houve um fracasso coletivo dos países no cumprimento dessas metas ambientais.
O capitalismo agregou mais acumulação, ele devastou mais, independente dessas convenções e das metas prefixadas nessas convenções. A Rio + 20 deveria fazer o quê? Identificar quais foram os principais pontos que geraram esse fracasso coletivo, porque que os países não conseguem conservar, porque não há um desenvolvimento sustentável, porque esse desenvolvimento baseado apenas na economia e no lucro, ele é incompatível com os territórios, com a geração de alimentos, com a conservação das águas, com a conservação da biodiversidade. Essa avaliação que deveria acontecer agora na Rio + 20, não vai acontecer.
Os principais dois temas que vão ocorrer aqui na Rio + 20 vão ser economia verde e governança internacional. Bom, economia verde parece um tema muito interessante: é a economia que agrega a conservação do meio ambiente. Então, o desenvolvimento sustentável que já se falava lá na ECO/92, então é bom? Os países vão fazer um desenvolvimento melhor? Não!
Quem está propondo a economia verde são as mesmas corporações que monopolizam o comércio de terras, de sementes, de agrotóxicos, de medicamentos no mundo. Essa economia, ela é “pintada de verde”. Mas falar da economia do petróleo, da economia marrom, da economia do agronegócio e falar da economia verde é falar da mesmíssima coisa.
A proposta da economia verde agrega três elementos importantes: a propriedade privada, a mercantilização e a financeirização dos bens comuns, ou seja, da natureza: do ar, das florestas, das terras. Agora, com a Rio + 20 com o termo economia verde agente agrega outras formas de propriedade privada sobre a natureza. Você tem a propriedade privada sobre o ar, que é o mercado de carbono, as árvores quando respiram carbono, emitem CO2, eles estão fazendo um título de propriedade. Não tem o título de propriedade sobre a terra? Depois não teve o título de propriedade da semente, da patente? O que é o título de propriedade sobre o CO2? Pra você comprar e vender ar se tem um título de propriedade sobre as árvores que vai capturar carbono. A mesma coisa que no Código Florestal que tá passando agora, que pode ser vetado, que vete Dilma Rousseff, veta tudo. Ali no Código Florestal existe a permissão de emitir um título de propriedade privada sobre 1 hectare de floresta nativa. Essa floresta nativa pode ser comprada  e vendida no comércio. Hoje nós temos uma bolsa de valores no Rio de Janeiro que foi fundada em dezembro de 2011, que pode negociar ativos ambientais.
O que são ativos ambientais? Quando você incorpora bens comuns como carbono, ar, biodiversidade, as florestas, no mercado financeiro, emitindo títulos de propriedade sobre esses bens. Do mesmo jeito que foi com a terra, do mesmo jeito que foi com as sementes. A proposta da economia verde é atrelada a economia marrom. Porque? Quanto mais carbono, quanto mais petróleo e carbono eu emitir queimando combustível fóssil, maior vai ser o valor ativo ambiental, do meu título financeiro.
Quanto mais prosperar a economia do petróleo, quanto mais prosperar o avanço, a degradação das florestas, maior valor vão ter  essa propriedade privada sobre os bens comuns. Então, a proposta que está sendo engendrada na Rio + 20 com o título de economia verde, é melhor agente esquecer esse termo. A economia verde é igual a economia marrom e ela está sendo monopolizada pelas mesmas cadeias produtivas que monopolizam as sementes, as terras e as tecnologias hoje. É propriedade privada, mercantilização e acumulação.
O projeto de Belo Monte na Amazônia hoje é um projeto que é tido, o Brasil vende essa tecnologia das hidrelétricas como uma tecnologia “limpa”, que não causa emissão de CO2 . Então, invés do Brasil estar instalando termo elétrica, que são alternativas poluentes, o Brasil está avançando com as hidrelétricas do país, que é uma energia “limpa”. Com isso o Brasil pode se cacifar como um país que é “limpo” e pode vender energia “limpa” pro mundo. A mesma coisa os agro-combustíveis, com os monocultivos de cana de açúcar, por exemplo, quanto mais avançar com monocultivos de cana, o álcool, o etanol é tido como  muito mais limpo que o petróleo. Nós sabemos que o Belo Monte significa na Amazônia, significa o alagamento de terras e perdas de terra e territórios para os indígenas e as comunidades tradicionais da Amazônia, assim com o a perda de biodiversidade, que é incalculável, quando nós poderíamos estar instalando pequenas hidrelétricas, pequenas centrais. Há alternativa ou uma pluralidade de tecnologias: a eólica, a hidrelétrica, vinda sim da biomassa, mas em pequena escala. Então, você tem alternativas nos territórios que já estão em construção.
Hoje no Brasil não se fala de reforma agrária, você não fala de titulação de territórios indígenas ou quilombolas, mas você fala na PEC 215 que quer entrar nos territórios indígenas ou acabar com a possibilidade da titulação das terras indígenas e quilombolas. Isso está sendo nos territórios. Essa proposta, vem como uma proposta  da economia verde. A PEC 215 é um projeto de emenda constitucional, pra emendar a constituição que transfere do executivo pro legislativo a competência de titulação de terras indígenas e quilombolas. Isso significa que passar para cada terra titulada teria que passar para o Congresso Nacional. Cada projeto de lei no Congresso Nacional demora 10, 15, 20 anos pra passar, ou seja, você inviabiliza a capacidade do governo titular territórios quilombolas ou indígenas no Brasil, ao mesmo tempo você tem a aprovação do Código Florestal.
Milhões e milhões de hectares estão sendo adquiridos para o projeto do agronegócio, pro seu projeto de modernização conservadora do campo contra reforma agrária e contra a titulação dos territórios indígenas e quilombolas. Ao mesmo tempo você tem  o Supremo Tribunal Federal que  coloca a provável inconstitucionalidade do decreto que regulamenta os territórios quilombolas no Brasil, você tem o retrocesso na pauta quilombola, o retrocesso na pauta indígena, o retrocesso da reforma agrária, mas ao mesmo tempo você tem a aprovação do Código Florestal que anistia de pena e multas o agronegócio, você tem milhões de hectares incorporados ao projeto do agronegócio, você tem a Belo Monte sendo colocada por meio internacional como um mecanismo e desenvolvimento  limpo do mesmo jeito dos monocultivos de cana.
Hoje nós temos um projeto de fixação do orçamento público pra agricultura de baixo carbono. Uma agricultura de baixo carbono, uma agricultura limpa seria uma agricultura, por exemplo, com plantio direto. O que é um plantio direto? São toneladas e toneladas de herbicidas, de agrotóxicos aplicados sobre soja, monocultivos de cana, isso é tido como mais limpo porque não revolve o solo porque não revolve o solo, não emite CO2, mas não se fala sobre a potencialidade lesiva dos agrotóxicos. E aí você tem acesso a crédito no Brasil com a desculpa climática para o agronegócio que vai colocar sementes da Syngenta agregada com maquinário da John Deere, ou seja, é um pacote tecnológico aliado a política pública falando que isso é menos poluente, emite menos carbono.
Não é a reforma agrária que está sendo colocada como alternativa para emissão de CO2, não é a agroecologia que não usa e que não é dependente de agrotóxicos e agrotóxicos vende uma fonte de petróleo, isso não é abordado. Hoje nós temos a campanha contra transgênicos no Brasil, isso não é tocado. As grandes pautas estruturais dos movimentos sociais, elas estão sendo renegadas em nome do clima. Em nome do clima e das mudanças climáticas, hoje nós temos um orçamento público vinculado novamente aos grandes proprietários dos meios de produção.


* Larissa Ambrosano Packer é advogada da Terra de Direitos – Organização de Direitos Humanos é mestre em Filosofia do Direito pela Universidade Federal do Paraná (UFPR).

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